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domingo, 23 de agosto de 2015

Evangelho XXII Domingo do Tempo Comum – Ano B - Mc 7, 1-8.14-15.21-23

Comentário ao Evangelho XXII Domingo do Tempo Comum – Ano B
Naquele tempo, 1 os fariseus e alguns mestres da Lei vieram de Jerusalém e se reuniram em torno de Jesus. 2 Eles viam que alguns dos seus discípulos comiam o pão com as mãos impuras, isto é, sem as terem lavado. 3 Com efeito, os fariseus e todos os judeus só comem depois de lavar bem as mãos, seguindo a tradição recebida dos antigos. 
4 Ao voltar da praça, eles não comem sem tomar banho. E seguem muitos outros costumes que receberam por tradição: a maneira certa de lavar copos, jarras e vasilhas de cobre. 5 Os fariseus e os mestres da Lei perguntaram então a Jesus: “Por que os teus discípulos não seguem a tradição dos antigos, mas comem o pão sem lavar as mãos?” 
6 Jesus respondeu: “Bem profetizou Isaías a vosso respeito, hipócritas, como está escrito: ‘Este povo Me honra com os lábios, mas seu coração está longe de Mim. 7 De nada adianta o culto que Me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos’. 8 Vós abandonais o Mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens”. 
14 Em seguida, Jesus chamou a multidão para perto de Si e disse: “Escutai todos e compreendei: 15 o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior. 21 Pois é de dentro do coração humano que saem as más intenções, imoralidades, roubos, assassínios, 22 adultérios, ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo. 23 Todas estas coisas más saem de dentro, e são elas que tornam impuro o homem” (Mc 7, 1-8.14-15.21-23).
Onde está o meu coração?
Face à hipocrisia farisaica, o Divino Mestre demonstra que o homem não se define pelas exterioridades, mas sim pelas intenções do coração.
Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
I – Qual o comportamento à altura da vida divina?
Todos nós nascemos em pecado, como inimigos de Deus e objeto de sua ira (cf. Ef 2, 3), mas, chamados a obter a posse da visão beatífica, fomos — ao lado dos Anjos — elevados à vida divina. Vida tão superior à simplesmente natural, que a graça — pela qual dela participamos — pertence ao sexto plano da criação, muito acima dos minerais, dos vegetais, dos animais, dos homens e até mesmo dos Anjos. É o próprio Deus quem toma a iniciativa de introduzi-la em nós pelo milagre extraordinário do Batismo que nos faz filhos d’Ele. Quando o sacerdote derrama água sobre a nossa cabeça e diz “Eu te batizo em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo”, deixamos de ser meros animais racionais para nos tornarmos entes divinos, com as virtudes da fé, esperança, caridade, prudência, justiça, fortaleza, temperança, e todos os dons do Espírito Santo infundidos na alma.
Na Liturgia do 22º Domingo do Tempo Comum encontramos estímulos, convites e esclarecimentos a respeito desta vida, para podermos merecer chegar à sua plenitude, ao passar do tempo à eternidade.

A vida sobrenatural: dom do “Pai das luzes”
Na segunda leitura (Tg 1, 17-18.21b-22.27) insiste São Tiago: “Todo dom precioso e toda dádiva perfeita vêm do alto; descem do Pai das luzes” (1, 17a). Não há dádiva mais perfeita do que esta vida sobrenatural! Três são as criaturas que têm “até certo ponto infinita dignidade”,1 pois Deus não podia fazê-las mais excelentes: Jesus Cristo Homem, Maria Santíssima e a visão beatífica; e esta última já a possuímos em germe, neste mundo, através da graça.
O “Pai das luzes, no qual não há mudança nem sombra de variação” (Tg 1, 17b) porque é o Ser Absoluto, “de livre vontade nos gerou pela Palavra da verdade, a fim de sermos como que as primícias de suas criaturas” (Tg 1, 18). Sim, Ele nos gerou para a vida divina através do seu Verbo, que Se encarnou para que todos tenhamos vida em abundância (cf. Jo 10, 10). Por isso nos cabe receber com humildade a Palavra de Deus, que é capaz de salvar nossas almas (cf. Tg 1, 21b).
“Todavia” — continua São Tiago — “sede praticantes da Palavra e não meros ouvintes, enganando-vos a vós mesmos” (1, 22); isto é, não basta conhecer a doutrina, é preciso respeitar as leis da vida sobrenatural, aprendendo a nos comportarmos de modo diferente, enfrentando as inclinações que brotam em nós devido ao pecado original, e vencendo-as para alcançar o prêmio prometido. Nisto consiste a prova que todos atravessamos, ao longo de nossa passagem pela Terra. Para mantermos a filiação divina é indispensável que desenvolvamos a vida da graça, cumprindo a Palavra. Para tal, adverte ainda São Tiago, é necessário, “não se deixar contaminar pelo mundo” (1, 27). O mundo, de fato, tem uma visualização carente de sobrenatural.
Por sua vez, o Salmo Responsorial é muito elucidativo, ao perguntar: “Senhor, quem morará em vossa casa e no vosso monte santo habitará?” (Sl 14, 1a). Como se dissesse: quem terá convívio convosco, ó Deus? Quem estará eternamente na vossa companhia? Quem gozará de vossa própria felicidade? Quem Vos verá face a face? Quem participará de vossos bens? E prossegue o salmista: “É aquele que caminha sem pecado e pratica a justiça fielmente” (Sl 14, 2), ou seja, aquele que ama a santidade e a põe em prática.
Para entrar na Terra Prometida, Israel deve abraçar o espírito sobrenatural
Na primeira leitura (Dt 4, 1-2.6-8) encontramos Moisés depois de ter realizado grandes maravilhas pelo poder de Deus. Ele livrara o povo hebreu da escravidão do Egito e, estendendo o seu cajado, dividira as águas do Mar Vermelho para que os israelitas o cruzassem até o outro lado, a pé enxuto (cf. Ex 14, 21-22). Em seguida, ante a tremenda ameaça das tropas egípcias que chegaram para os prender e levar de volta — porque o Faraó se arrependera de os ter deixado partir —, ele levantara novamente o seu braço e as águas se juntaram e deglutiram todo o exército inimigo (cf. Ex 14, 27-28).
Seguiram-se quarenta anos no deserto, durante os quais Moisés tirou água da pedra, Deus fez descer do céu o maná e mandou vir codornizes sobre o acampamento dos israelitas para os alimentar (cf. Ex 17, 1-6; 16, 4-31), bem como outros milagres estupendos. Quatro décadas de educação e aprendizagem para aquele povo, e também de castigo, por terem praticado o mal! Apesar dessas infidelidades, Deus não falta à sua promessa; pelo contrário, Ele a cumpre, entregando-lhes a Terra Prometida.
Chegada a hora de ali entrar, trata-se de o povo retribuir o bem já recebido, assim como aquele que ainda iria receber. No que consiste esta reciprocidade? Eis o ensinamento da leitura: em abraçar o espírito sobrenatural e observar a conduta moral e religiosa prescrita por Deus, com o intuito de estabelecer um relacionamento entre Ele e o povo. Os decretos que o profeta transmite manifestam a superioridade da nação eleita pelo Senhor “perante os povos” (Dt 4, 6) e são, segundo a linguagem do próprio Moisés, “justos” (Dt 4, 8). Sim, porque, como indica São Paulo, esta Lei era um educador para conduzir os hebreus até Nosso Senhor Jesus Cristo e serem justificados pela fé n’Ele (cf. Gal 3, 24).
Sem a Lei de Deus não há participação na vida divina
Ora, o verdadeiro espírito dos preceitos positivos da Lei Mosaica estava sintetizado no Decálogo, explicitação do comportamento que devemos ter para sermos semelhantes ao Criador. Estas simples leis resumem, de modo excelente, no que consiste o exercício da vida divina em nossas almas e nos torna adequados a ela.
Sem a guarda dos Dez Mandamentos não se participa da vida de Deus, pois, a partir do momento em que é cometido um pecado grave, pela transgressão de qualquer deles, perde-se a graça santificante e a inabitação da Santíssima Trindade na alma, voltando esta a ser escrava do demônio. “O pecado mortal é o inferno em potência. É, pois, como um desabamento instantâneo de nossa vida sobrenatural, um verdadeiro suicídio da alma para a vida da graça”.2

Mas a natureza humana é profundamente lógica: quando o homem, arrastado por suas más inclinações, quer praticar o mal, antes mesmo de perpetrá-lo ele inventa uma racionalização para justificar seu ato. E, aos poucos, vai criando outra religião, com uma moral diversa, independente da Lei de Deus. Esta é a tendência que, sob a capa de fidelidade aos ensinamentos de Moisés, veremos retratada no Evangelho deste domingo e desmascarada por Nosso Senhor Jesus Cristo.
Continua no próximo post

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