CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO III DOMINGO DA PÁSCOA
3 Simão Pedro disse-lhes: “Vou pescar”. Responderam-lhe:
“Nós vamos também contigo”. Partiram e entraram numa barca. Naquela noite nada
apanharam.
A noite é o período mais
propício para a pesca e, certamente, hábeis e experientes nesse ofício, intuíam
um bom êxito naquele empreendimento proposto por Pedro. Bastou ele comunicar
seu plano que todos os outros se congregaram naquela aventura, tanto mais que
deveriam estar carentes de subsídios para seu dia-a-dia. Pedro, sempre
entusiasmado e não menos impetuoso, paulatinamente se havia constituído em
propulsor dos Apóstolos.
Deu-se a partida cheia de esperança.
Entretanto, com o passar das horas, a constatação da ineficácia de seus
esforços fazia-lhes crescer no coração a convicção de quanto dependiam de um
auxílio divino.
4 Chegada a manhã, Jesus apresentou-Se na praia, mas os
discípulos não conheceram que era Ele.
O senso de observação era rico
naquela civilização orgânica. Sem jornal, televisão, cinema ou rádio, as
notícias se espalhavam oralmente e, por essa razão, surgiam espectadores da
realidade por todas as partes. Assim, tomaram com naturalidade a presença de
Jesus na praia, sem reconhecê-Lo de imediato. Aliás, da mesma forma havia
procedido o Mestre com os discípulos de Emaús e com Madalena.
5 Jesus disse-lhes: “Rapazes, tendes alguma coisa para
comer?” Responderam-Lhe: “Nada”.
Jesus, mesmo ao dirigir-lhes a
palavra, voluntariamente não revela sua identidade, quer comunicar-Se com eles
de forma exclusivamente humana, quiçá até mesmo modificando o timbre de voz e a
expressividade, para não ser reconhecido. Este minúsculo detalhe nos mostra o
quanto Jesus pode estar presente junto de nós em nossas atividades quotidianas,
sem nós nos darmos conta. Compreenderemos no dia de nosso Juízo a que extremo
Ele foi nosso companheiro a cada segundo, observando até nossos pensamentos e
desejos.
Neste curto diálogo, Jesus
propicia aos sete Apóstolos o sonho com um possível freguês. É curioso notar
como, apesar do fracasso noturno, estão dispostos a uma nova tentativa para não
perder o hipotético comprador. Assim devemos ser nós em nossos afazeres,
sobretudo os apostólicos, ou seja, nunca desanimar. Sempre há uma última
chance.
6 Disse-lhes: “Lançai a rede para o lado direito da
barca e encontrareis.” Lançaram a rede e já não a podiam arrastar, por causa da
grande quantidade de peixes.
Sendo Jesus onipotente, sua didática
é divina. A fim de tornar ainda mais maravilhoso o milagre a ser por Ele
operado, aproveita-se de uma noite de fracasso para aconselhar-lhes a lançar
uma vez mais a rede. Nossas desilusões com as puras forças da natureza muitas
vezes nos são úteis para convencer-nos da infinitude do poder de Deus.
Jesus orienta que seja do lado
direito da barca. Por quê?
Quem nos explica é o grande
Santo Agostinho (2): “Essa pesca se faz depois da Ressurreição do Senhor para
nos indicar qual será o estado da Igreja após a nossa ressurreição. ‘Lançai a
rede à direita da barca’ (Jo 21, 6) disse o Senhor. Os que estão à direita não
se confundirão com os outros. Não esquecestes como o Filho do Homem nos garantiu
sua vinda no meio dos anjos; as nações comparecerão diante d’Ele, e Ele as
separará como o pastor separa as ovelhas dos cabritos, as ovelhas à direita, os
cabritos à esquerda, e dirá depois às ovelhas: ‘Vinde (...)tomai posse do
reino’; e aos cabritos: ‘apartai-vos de mim, malditos, ao fogo eterno’ (Mt. 25,
31-41). ‘Lançai a rede à direita’ significa, portanto, vede-me ressuscitado’.
Quero dar-vos uma imagem do que vai ser a Igreja na Ressurreição dos mortos.
‘Lançai à direita’ (...)Lançaram a rede à direita e mal podiam levantá-la, tal
era o seu peso!”
7 Então aquele discípulo a quem Jesus amava disse a
Pedro: “É o Senhor!” Simão Pedro, ao ouvir dizer que era o Senhor, cingiu-se
com a túnica, porque estava nu, e lançou-se à água.
Compreensível e belo era que o
discípulo mais amado, somando suas impressões ainda implícitas à constatação da
superabundância de peixes obtida, fosse o primeiro a concluir quem era aquele
possível freguês. O timbre da voz, o decidido da ordem e a plenitude do efeito
levaram João a reconhecê-Lo: “É o Senhor!”, exclamou ele.
Entretanto, o que mais amava,
devido ao seu temperamento impetuoso e arrojado, foi o único a lançar-se nas
águas. A dor pela falta cometida, o entusiasmo por Jesus, a rede pesadíssima,
etc. fizeram-no optar por vias mais rápidas e decididas. Porém, por estar
usando uma roupa comum dos pescadores daqueles tempos, devido a serem quentes
os ares do Lago de Genezaré naquela época do ano, viu-se Pedro na contingência
de cingir-se com a túnica, para nadar os cem metros que o separavam de Jesus. O
“porque estava nu” não significa que estivesse de todo despido, mas sim com o
sumário traje de pescador.
Curioso é de se notar que na
época de Jesus nadava-se cingido de túnica.
8 Os outros discípulos, que não estavam distantes da
terra senão duzentos côvados, vieram no barco puxando a rede cheia de peixes.
Ouçamos Santo Agostinho
comentar este versículo (3): “Trouxeram a rede até a margem. (...) Ao dizer-se
‘margem’, deve-se entender ‘fim do mar’; e por ‘fim do mar’, entende-se fim do
século. Na primeira pesca, as redes não foram trazidas até a margem, pelo
contrário, os peixes foram colocados dentro das barcas. Agora não, são
arrastadas até a praia. Espera o fim do século. Ele virá para o bem dos que
estiverem à direita e para o mal dos que estiverem à esquerda”.
Continua no próximo post.
Nenhum comentário:
Postar um comentário