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quarta-feira, 3 de julho de 2013

EVANGELHO XIV DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO C - 2013 - Lc 10, 1-12.17-20

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO 14º DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO C 2013 Lc 10, l-12.17-20
Instruções aos enviados
Depois desses precedentes, Nosso Senhor passa a instruir os discípulos sobre a conduta a ser seguida na evangelização. Pressuposto fundamental para bem considerarmos os próximos versículos é termos em vista que Jesus falava de acordo com os costumes do tempo, muito diferentes dos hábitos da atualidade. Todavia, como a palavra de Deus “permanece eternamente” (Is 40, 8), tais determinações continuam válidas em nossos dias, bastando saber interpretá-las. Passemos, portanto, a analisar essas normas, registradas por São Lucas à maneira de um diretório de apostolado, um autêntico vade-mécum de quem é chamado a evangelizar.
“Não leveis bolsa nem sacola nem sandálias...’
Devido aos contratempos próprios a um deslocamento a pé, um par extra de sandálias era acessório indispensável a qual quer viajante, bem como a bolsa e a sacola. Esta última servia para transportar, além de outros pertences, alimentos frugais em geral, frutos secos, como tâmaras e figos —, para repor as energias pelo caminho.” O dinheiro era guardado na bolsa. Diante da real necessidade de tais apetrechos numa viagem, parece um tanto estranha a recomendação do Divino Mestre. No entanto, ela visava imunizar os discípulos contra o mundanismo, vício que leva a pessoa a colocar sua primeira atenção nos bens materiais, buscando neles a própria segurança. De acordo com essa errônea visualização, os utensílios mencionados por Nosso Senhor tinham certo valor simbólico, pois indicavam as condições financeiras de seu proprietário e, enquanto tais, eram usados com a intenção de angariar prestígio junto à opinião pública. Mas, procedendo-se do modo indicado por Jesus, exigia-se dos discípulos o inteiro abandono à Providência, como ensina São Gregório Magno: “Tal deve ser a confiança do pregador em Deus que, mesmo não estando munido das coisas necessárias para a vida, deve estar persuadido de que elas não lhe faltarão. Não aconteça que, enquanto se ocupa de prover-se das coisas temporais, deixe de procurar, para os outros, as eternas”.12
Vigilância no relacionamento humano
4b “… não cumprimenteis ninguém pelo caminho!”
Os costumes sociais judaicos seguidos naquele tempo não permitiam cumprimentos rápidos e simplificados, como os adotados no mundo hodierno, no qual as normas da educação, já reduzidas ao essencial, tornam-se cada vez mais carentes de gentileza e distinção. As interjeições monossilábicas pronunciadas por duas pessoas quando se encontram hoje em dia correspondiam outrora cerimoniosas e prolongadas saudações, e entre os orientais elas eram acrescidas de uma razoável conversa, trocando-se notícias a respeito dos familiares, dos negócios e da saúde, entre outros assuntos. 13 Além de adiar a realização dos deveres de evangelização — sobretudo nas estradas palestinas, onde sempre havia intensa circulação de viajantes —, tais cumprimentos podiam ser uma temeridade para o missionário, devido às más influências às quais se expunha, relacionando-se com pessoas que, grosso modo, viviam de acordo com máximas do mundo. Além disso, não eram os transeuntes o alvo da missão, e sim as populações dos locais indicados por Jesus. Com isso, Nosso Senhor ensinava não só aos que O ouviam no momento, mas a todos os seus futuros seguidores, o quanto a falta de vigilância no convívio com pessoas cuja vida não está pautada pela boa doutrina pode levar ao esmorecimento das convicções religiosas. E ressaltava a importância de nunca colocarmos em risco nossa própria salvação sob o pretexto de fazer o bem aos outros.
A palavra, instrumento da graça
5“Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz esteja nesta casa!’ 6 Se ali morar um amigo da paz, a vossa paz repousará sobre ele; se não, ela voltará para vós”.
Nesses dois versículos, o Mestre assinala como à voz do discípulo está vinculada a ação da graça, e confere aos seus enviados o poder de estabelecer a paz nas almas dóceis à intervenção de Deus. Ora, segundo a clássica definição de Santo Agostinho, a paz é a tranquilidade da ordem.14 Portanto, os seguidores de Jesus — em especial os chamados a exercer o ministério sagrado — devem estar compenetrados de que suas palavras são revestidas de particular expressividade, unção e força de persuasão para ordenar as almas rumo ao cumprimento de sua finalidade, ou seja, à santidade e à glória de Deus. E tal é a sublimidade da vocação que o apóstolo se beneficia inclusive quando a pregação é rejeitada ou recebida com indiferença, pois os esforços por ele empregados nesses casos não são frustrados, redundando em graças para seu próprio progresso espiritual.
O sustento material
7a“Permanecei naquela mesma casa, comei e bebei do que tiverem, porque o trabalhador merece o seu salário”.
Renunciando à possibilidade de obter lucros profissionais, como o comum das pessoas, o missionário consome toda a sua existência no exercício da missão, cabendo aos beneficiários dela a responsabilidade de lhe prover sustento e hospedagem, como argumenta São Paulo: “Se entre vós semeamos bens espirituais, será, porventura, demasiada exigência colhermos de vossos bens materiais?” (I Cor 9, 11). Como consequência do auxílio prestado aos discípulos, os doadores participam de maneira mais profunda das graças concedidas pela Providência àquela missão específica e, no momento de prestar contas a Deus, no Juízo após a morte, tal assistência se transformará em elemento de misericórdia, segundo a promessa do Salvador: “Quem vos der de beber um copo de água porque sois de Cristo, digo-vos em verdade: não perderá a sua recompensa” (Mc 9, 41).
7b “Não passeis de casa em casa”.
Nesta ordem, Jesus pede dos enviados a virtude que tanto se identifica com a alma generosa de um apóstolo: a abnegação. Nunca se atendo às próprias comodidades, nem exigindo regalias, devem adaptar-se com facilidade às circunstâncias adversas, sabendo viver na penúria e também na abundância (cf. F14, 12). Como aponta São Gregório Nazianzeno, “em resumo, eles devem ser tão virtuosos que o Evangelho se propague mais pelo modelo de sua vida do que por sua palavra”.15
Fator de salvação ou de condenação
8“Quando entrardes numa cidade e fordes bem recebidos, comei do que vos servirem, “curai os doentes que nela houver e dizei ao povo: ‘O Reino de Deus está próximo de vós”.
Além de reiterar a norma contida no versículo anterior, Nosso Senhor ordena aos discípulos que sanem as enfermidades — sobretudo as espirituais, causadas pelo pecado — e, procurando livrar as almas das preocupações terrenas para elevá-las às considerações sobrenaturais, anunciem-lhes a proximidade do Reino de Deus. Teofilato relaciona os dois aspectos: “Quando são curados na alma, aproxima-se deles o Reino de Deus, que está longe daquele em quem domina o pecado”.’6
10 “Mas, quando entrardes numa cidade e não fordes bem recebidos, saindo pelas ruas, dizei:11 ‘Até a poeira de vossa cidade que se apegou aos nossos pés, sacudimos contra vós’. No entanto, sabei que o Reino de Deus está próximo! 12 Eu vos digo que, naquele dia, Sodoma será tratada com menos rigor do que essa cidade”.
Diante da rejeição daqueles a quem o apóstolo quis fazer o bem, a atitude indicada por Nosso Senhor é uma forma de incentivar o temor a Deus, “um apelo à consciência”.’7 Mesmo quando repudiado, o pregador não deve calar-se sobre as verdades da Fé, conforme o conselho dado a Isaías: “Clama em alta voz, sem constrangimento; faze soar a tua voz como a corneta. Denuncia a meu povo suas faltas” (Is 58, 1). E acrescenta o Salvador que, no dia do Juízo, a consideração dada à palavra dos representantes de Deus será fator de salvação ou de condenação para cada um dos que a ouviram.
Regresso dos discípulos
17 Os setenta e dois voltaram muito contentes, dizendo: “Senhor, até os demônios nos obedeceram por causa do teu nome”.18 Jesus respondeu: Eu vi Satanás cair do céu, como um relâmpago”.
O sucesso obtido nesta primeira missão “indício manifesto do grande triunfo”18 da Igreja no de correr da História, como observa São João Crisóstomo — é sublinhado por São Lucas ao descrever o estado de ânimo geral dos setenta e dois: voltaram cheios de alegria, pois haviam atingido o objetivo para o qual Jesus os enviara, além de terem com provado a força d’Ele, a cujo nome os próprios demônios obedeciam.

Fazendo alusão à queda de satanás precipitado no  inferno ainda antes da criação do homem, Nosso Senhor dava mais uma prova de divindade, declarando sua eternidade, e anunciava que, com a expansão da pregação evangélica, o demônio, dominador do mundo desde o pecado original, começava a ser definitivamente derrotado: “Se Jesus persegue tanto os demônios, [...] é que Deus age n’Ele com império e seu reino já começou”.19

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