-->

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Evangelho XVI Domingo do Tempo Comum - Ano C - 2013 - Lc 10, 38-42

Continuação dos comentários ao Evangelho XVI Domingo do Tempo Comum -  Ano C - 2013 - Lc 10, 38-42
Almas “Marta” e almas “Maria”
Detenhamos-nos na importante questão que aqui se apresenta e tantas vezes é mal interpretada.
Pode-se inferir da resposta do Divino Mestre que Ele condenava o cuidado das coisas concretas, as quais não passarão para a eternidade e, portanto, não merecem nossa atenção? Deveriam todos, então, dedicar-se exclusivamente à contemplação das verdades eternas?
Não é essa a lição que devemos tirar desta passagem do Evangelho, pois, como observa Santa Teresa de Jesus de modo pitoresco e cheio de bom senso, se Marta “permanecesse, como Madalena, embevecida aos pés do Senhor, ninguém daria de comer a este Divino Hóspede”.11
Cristo não afirma aqui que Marta deveria abandonar aquelas indispensáveis ocupações, o que é posto em evidência por Santo Agostinho, com sua característica vivacidade:
“Devemos pensar que Jesus vituperou a atividade de Marta, ocupada no exercício da hospitalidade, ao recebê-Lo em sua casa? Como podia ser com justiça censurada quem se deleitava em acolher tão notável Hóspede? Se assim for, cessem os homens de socorrer os necessitados e escolham para si a melhor parte, a qual não lhes será tirada; dediquem-se à meditação da palavra divina, almejem ardentemente a doçura da doutrina, consagrem-se à ciência da salvação; não se preocupem em saber se há na aldeia algum peregrino ou algum pobre sem alimento ou roupa; desinteressem-se de visitar os enfermos, de resgatar o cativo, de enterrar os mortos; abandonem as obras de misericórdia e apliquem-se à única ciência. Se esta é a melhor parte, por que não nos dedicarmos todos a ela, já que, nessa matéria, temos o próprio Senhor como nosso defensor?”.12
A resposta dada por Jesus fora muito sutil e, como bem observa o Cardeal Gomá, “encerra todo um programa de vida que é a concretização do sumo equilíbrio do Cristianismo na ordem da ação”.13 Nas pessoas de Marta e Maria, deixou o Divino Mestre uma lição para toda a humanidade.
Contemplação operativa e ação contemplativa
Contemplação e ação não são realidades excludentes. Ensina São Tomás que a primeira é, sem dúvida, mais excelente e meritória que a segunda.14 Entretanto, acrescenta ele, a ação que procede da plenitude da contemplação é preferível à simples contemplação.15 A este ensinamento do Doutor Angélico, faz eco Fillion: “Embora a parte de Maria tenha algo de mais celestial, o melhor, nas situações ordinárias, é unir a condição de Marta com a de Maria”.16
A perfeição está, pois, na junção entre contemplação e ação. Disso dá-nos supremo exemplo a Sagrada Família. Nossa Senhora cuidava com inigualável esmero da casa em Nazaré, e São José era com certeza o mais consciencioso dos carpinteiros. Ambos trabalhavam, cada um nos seus afazeres. Entretanto, tinham constantemente a atenção voltada para Jesus e para os aspectos mais elevados da realidade, a ponto de São Luís Maria Grignion de Montfort afirmar que Nossa Senhora, ao dar um ponto com a agulha, glorificava mais a Deus do que São Lourenço sofrendo na grelha as terríveis dores do seu martírio.17
Então, podemos também nós dar muita glória a Deus nos atos concretos do dia a dia, desde que os realizemos com a atenção posta nas coisas celestes, e não apenas nas terrenas. Assim fez Cristo Jesus durante Sua vida pública: ocupadíssima, intensíssima, entretanto, sempre impregnada de oração e contemplação.
A preocupação naturalista de Marta
Como deveria, então, ter agido Marta neste episódio?
Ela era, como vimos, a responsável pela casa e cabia-lhe tomar as providências para o bom atendimento de Nosso Senhor. Assim, começou bem ao querer servi-Lo e agradá-Lo. Porém, sem ela se dar conta — como sói acontecer — essa louvável aspiração foi sendo substituída por uma preocupação naturalista, acompanhada pelo desejo de fazer bela figura diante d’Ele e dos demais.
Se executasse todas aquelas tarefas pondo em Jesus a atenção principal, ficaria ela também com a melhor parte, os frutos de seu trabalho teriam outra beleza e outra substância. Não lhe era preciso, portanto, deixar suas ocupações para ir sentar-se, como Maria, aos pés de Jesus, mas, segundo sublinha acertadamente Fillion, ter em vista que “o único necessário é preferir as coisas interiores às exteriores, dar-se a Cristo sem restrições, adorando-O, amando-O e vivendo só para Ele”.18


O amor imperfeito de Maria
O Divino Mestre diz que Maria escolheu a melhor parte, mas não afirma ter ela agido impelida por um amor perfeito.
Nosso Senhor é cioso da obediência devida às autoridades intermediárias e, portanto, deveria Maria ter se submetido às determinações de sua irmã mais velha, cumprindo as obrigações que lhe cabiam sem perder o enlevo, mantendo o coração todo posto no Senhor. “Não imagines — adverte o Doutor Seráfico — que teu amor à quietude te autorize a subtrair-te, mesmo em coisas mínimas, aos exercícios da santa obediência ou das regras estabelecidas pelos anciãos”.19
Portanto, pode-se afirmar que Maria não atuou de forma exímia, na medida em que menosprezou a parte menos perfeita, esquivando-se de assumir incumbências necessárias para o bom atendimento a Jesus.

Nenhum comentário: