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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Pesca milagrosa II

Continuação da pesca milagrosa
6 Disse-lhes: “Lançai a rede para o lado direito da barca e encontrareis.” Lançaram a rede e já não a podiam arrastar, por causa da grande quantidade de peixes.
Sendo Jesus onipotente, sua didática é divina. A fim de tornar ainda mais maravilhoso o milagre a ser por Ele operado, aproveita-se de uma noite de fracasso para aconselhar-lhes a lançar uma vez mais a rede. Nossas desilusões com as puras forças da natureza muitas vezes nos são úteis para convencer-nos da infinitude do poder de Deus.
Jesus orienta que seja do lado direito da barca. Por quê?
Quem nos explica é o grande Santo Agostinho (2): “Essa pesca se faz depois da Ressurreição do Senhor para nos indicar qual será o estado da Igreja após a nossa ressurreição. ‘Lançai a rede à direita da barca’ (Jo 21, 6) disse o Senhor. Os que estão à direita não se confundirão com os outros. Não esquecestes como o Filho do Homem nos garantiu sua vinda no meio dos anjos; as nações comparecerão diante d’Ele, e Ele as separará como o pastor separa as ovelhas dos cabritos, as ovelhas à direita, os cabritos à esquerda, e dirá depois às ovelhas: ‘Vinde (...) tomai posse do reino’; e aos cabritos: ‘apartai-vos de mim, malditos, ao fogo eterno’ (Mt. 25, 31-41). ‘Lançai a rede à direita’ significa, portanto, vede-me ressuscitado’. Quero dar-vos uma imagem do que vai ser a Igreja na Ressurreição dos mortos. ‘Lançai à direita’ (...) Lançaram a rede à direita e mal podiam levantá-la, tal era o seu peso!”
7 Então aquele discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: “É o Senhor!” Simão Pedro, ao ouvir dizer que era o Senhor, cingiu-se com a túnica, porque estava nu, e lançou-se à água.
Compreensível e belo era que o discípulo mais amado, somando suas impressões ainda implícitas à constatação da superabundância de peixes obtida, fosse o primeiro a concluir quem era aquele possível freguês. O timbre da voz, o decidido da ordem e a plenitude do efeito levaram João a reconhecê-Lo: “É o Senhor!”, exclamou ele.
Entretanto, o que mais amava, devido ao seu temperamento impetuoso e arrojado, foi o único a lançar-se nas águas. A dor pela falta cometida, o entusiasmo por Jesus, a rede pesadíssima, etc. fizeram-no optar por vias mais rápidas e decididas. Porém, por estar usando uma roupa comum dos pescadores daqueles tempos, devido a serem quentes os ares do Lago de Genezaré naquela época do ano, viu-se Pedro na contingência de cingir-se com a túnica, para nadar os cem metros que o separavam de Jesus. O “porque estava nu” não significa que estivesse de todo despido, mas sim com o sumário traje de pescador.
Curioso é de se notar que na época de Jesus nadava-se cingido de túnica.
8 Os outros discípulos, que não estavam distantes da terra senão duzentos côvados, vieram no barco puxando a rede cheia de peixes.
Ouçamos Santo Agostinho comentar este versículo (3): “Trouxeram a rede até a margem. (...) Ao dizer-se ‘margem’, deve-se entender ‘fim do mar’; e por ‘fim do mar’, entende-se fim do século. Na primeira pesca, as redes não foram trazidas até a margem, pelo contrário, os peixes foram colocados dentro das barcas. Agora não, são arrastadas até a praia. Espera o fim do século. Ele virá para o bem dos que estiverem à direita e para o mal dos que estiverem à esquerda”.
9 Logo que saltaram para terra, viram umas brasas acesas, peixe em cima delas, e pão.
Segundo São João Crisóstomo e muitos outros autores, foi intenção do evangelista fazer notar a evidência do milagre operado por Jesus. Comentam eles a nova maneira de agir sobre a natureza, após a Ressurreição. Antes, o Senhor se aproveitava de matéria existente, agora já não, a realização é ainda mais maravilhosa, ou seja, certamente do nada tirou Jesus as brasas, o peixe e o pão. Como medir a delicadeza do gesto de Quem amou os seus e os amou até o fim?
10 Jesus disse-lhes: “Trazei dois peixes que apanhastes agora.”
Esse pedido feito por Jesus não visava apenas aumentar a quantidade de peixes a serem comidos por eles. De maneira sempre afetuosa e com ilimitada bondade, Jesus deseja fazê-los comprovar a grandeza da pesca realizada. Até esse momento, os Apóstolos estavam absortos na contemplação do Mestre e até já haviam se esquecido dos peixes e da barca. Em realidade, seu propósito era o de que trouxessem todos os peixes e os contassem.
11 Simão Pedro subiu à barca e arrastou a rede para terra, cheia de cento e cinquenta e três grandes peixes. E, sendo tantos, não se rompeu a rede.
Pedro, em seu ardoroso amor, está sempre pronto a, com arrojo, atender às solicitações de Jesus. Sua disponibilidade total não se cifra somente ao fato de ser ele o dono da barca. Ele sozinho termina a operação iniciada pelos outros. O primeiro no amor, o mais flexível na obediência. Aí está a verdadeira raiz da qual retiram substanciosa seiva todas as virtudes: o amor.
O número cento e cinquenta e três suscitou ao longo dos séculos — e até mesmo entre os Padres da Igreja — uma variada gama de opiniões. Entre somas, subtracções e multiplicações, uma corrente de teólogos e de exegetas atribuíram um notório caráter simbólico a essa cifra. Outros, porém, — e é a opinião predominante hoje em dia — julgam ter sido intenção exclusiva do evangelista, a de ressaltar a grandeza do milagre.
Simbólica, sem dúvida alguma, é a afirmação contida no fim do versículo, ou seja, apesar do grande número e do porte dos peixes, a rede não se rompeu. Quase todos os autores procuram tornar clara essa passagem de São João. Santo Agostinho é o mais feliz em interpretá-la.
Explica-nos ele a diferença entre as duas pescas, no tocante à integridade da rede. Na primeira, rompeu-se. Símbolo das heresias que surgiriam ao longo dos séculos. Na descrita pelo Evangelho de hoje, a rede manteve-se intacta apesar do enorme peso. Esta é uma pré-figura da Igreja após a ressurreição dos mortos, na qual haverá o supremo império da paz dos justos.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

As pescas milagrosas

A PRIMEIRA PESCA MILAGROSA
Jesus é o Mestre. Ele ensina de maneira insuperável, aproveitando-se dos episódios do dia-a-dia para elevar as almas ao amoroso conhecimento das vias escolhidas para seus eleitos. Aqueles homens estavam habituados aos ofícios e mistérios do mar, e era a partir dessa realidade que o Senhor queria conduzi-los às mais altas paragens da santidade.
No milagre anterior (Lc 5, 1-7), Jesus ordenara o lançamento das redes sem determinar se à esquerda ou à direita, para significar a universalidade da missão da Igreja Militante, a qual deve atingir tanto os bons quanto os maus, até o momento da separação definitiva entre o joio e o trigo. Os peixes foram recolhidos em tal abundância que chegaram a romper as redes, rompimento este, símbolo das heresias que surgiriam no futuro. As barcas quase se afundaram, representação dos riscos tremendos pelos quais, incólume, passaria a Igreja. Estas e outras figuras nos fazem compreender a situação da Igreja durante o curso da História.
Já a pesca do Evangelho de hoje, realizada depois da ressurreição do Senhor, foi por Ele ordenada a fim de nos mostrar o estado da Igreja Triunfante após o Juízo Final.
1 Depois disto, Jesus voltou a mostrar-Se aos seus discípulos, junto do mar de Tiberíades. Mostrou-Se deste modo:
Jesus não mais convivia com os seus, como anteriormente fizera. Por isso o versículo começa com as palavras: “Depois disto”. Já estava em corpo glorioso e, conforme nos ensina São Tomás, Jesus poderia ser ou não visto, dependendo de sua vontade os discípulos O veriam somente se Ele se mostrasse. Esta é a razão teológica pela qual João narra:“Mostrou-Se deste modo”.
2 Estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael, que era de Caná da Galiléia, os filhos do Zebedeu e dois outros dos seus discípulos.
Ainda não havia descido sobre eles o Espírito Santo. As aparições de Jesus eram esporádicas. Estavam desocupados e, assim sendo, se juntavam para mutuamente se apoiarem. Eram sete ao todo, número que chama a atenção de alguns autores pelo seu significado de multiplicidade.
3 Simão Pedro disse-lhes: “Vou pescar”. Responderam-lhe: “Nós vamos também contigo”. Partiram e entraram numa barca. Naquela noite nada apanharam.
A noite é o período mais propício para a pesca e, certamente, hábeis e experientes nesse ofício, intuíam um bom êxito naquele empreendimento proposto por Pedro. Bastou ele comunicar seu plano que todos os outros se congregaram naquela aventura, tanto mais que deveriam estar carentes de subsídios para seu dia-a-dia. Pedro, sempre entusiasmado e não menos impetuoso, paulatinamente se havia constituído em propulsor dos Apóstolos.
Deu-se a partida cheia de esperança. Entretanto, com o passar das horas, a constatação da ineficácia de seus esforços fazia-lhes crescer no coração a convicção de quanto dependiam de um auxílio divino.
4 Chegada a manhã, Jesus apresentou-Se na praia, mas os discípulos não conheceram que era Ele.
O senso de observação era rico naquela civilização orgânica. Sem jornal, televisão, cinema ou rádio, as notícias se espalhavam oralmente e, por essa razão, surgiam espectadores da realidade por todas as partes. Assim, tomaram com naturalidade a presença de Jesus na praia, sem reconhecê-Lo de imediato. Aliás, da mesma forma havia procedido o Mestre com os discípulos de Emaús e com Madalena.
5 Jesus disse-lhes: “Rapazes, tendes alguma coisa para comer?” Responderam-Lhe: “Nada”.
Jesus, mesmo ao dirigir-lhes a palavra, voluntariamente não revela sua identidade, quer comunicar-Se com eles de forma exclusivamente humana, quiçá até mesmo modificando o timbre de voz e a expressividade, para não ser reconhecido. Este minúsculo detalhe nos mostra o quanto Jesus pode estar presente junto de nós em nossas actividades quotidianas, sem nós nos darmos conta. Compreenderemos no dia de nosso Juízo a que extremo Ele foi nosso companheiro a cada segundo, observando até nossos pensamentos e desejos.
Neste curto diálogo, Jesus propicia aos sete Apóstolos o sonho com um possível freguês. É curioso notar como, apesar do fracasso noturno, estão dispostos a uma nova tentativa para não perder o hipotético comprador. Assim devemos ser nós em nossos afazeres, sobretudo os apostólicos, ou seja, nunca desanimar. Sempre há uma última chance.

Continua no próximo post...