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sábado, 16 de março de 2013

EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49 Ano C 2013

COMENTÁRIOS AO  EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49  Ano C 2013


Evangelho da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo Lucas [versão mais breve]

Naquele tempo, toda a multidão se levantou e levou Jesus a Pilatos. 2 Começaram então a acusá-Lo, dizendo: Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo, proibindo pagar impostos a César e afirmando ser ele mesmo Cristo, o Rei”. Pilatos o interrogou: “Tu és o rei dos judeus?” Jesus respondeu, declarando: “Tu o dizes!”  Então Pilatos disse aos sumos sacerdotes e à multidão: “Não encontro neste homem nenhum crime”. Eles, porém, insistiam: “Ele agita o povo, ensinando por toda a Judeia, desde a Galileia, onde começou, até aqui”. 6 Quando ouviu isto, Pilatos perguntou: “Este homem é galileu?”
7Ao saber que Jesus estava sob a autoridade de Herodes, Pilatos enviou-o a este, pois também Herodes estava em Jerusalém naqueles dias. 8Herodes ficou muito contente ao ver Jesus, pois havia muito tempo desejava vê-lo. Já ouvira falar a seu respeito e esperava vê-lo fazer algum milagre. 9Ele interrogou-o com muitas perguntas. Jesus, porém, nada lhe respondeu.
10 Os sumos sacerdotes e os mestres da Lei estavam presentes e o acusavam com insistência. 11Herodes, com seus soldados, tratou Jesus com desprezo, zombou dele, vestiu-o com uma roupa vistosa e mandou-o de volta a Pilatos. 12Naquele dia Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos.
13Então Pilatos convocou os sumos sacerdotes, os chefes e o povo, e lhes disse: 14“Vós me trouxestes este homem como se fosse um agitador do povo. Pois bem! Já o interroguei diante de vós e não encontrei nele nenhum dos crimes de que o acusais; 15nem Herodes, pois o mandou de volta para nós. Como podeis ver, ele nada fez para merecer a morte. 16Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”. 18Toda a multidão começou a gritar: “Fora com ele! Solta-nos Barrabás!”
18Barrabás tinha sido preso por causa de uma revolta na cidade e por homicídio. 20Pilatos falou outra vez à multidão, pois queria libertar Jesus. 21Mas eles gritaram: “Crucifica-o! Crucifica-o!” 22E Pilatos falou pela terceira vez: “Que mal fez este homem? Não encontrei nele nenhum crime que mereça a morte. Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”. 23Eles, porém, continuaram a gritar com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles aumentava sempre mais. 24Então Pilatos decidiu que fosse feito o que eles pediam. 25Soltou o homem que eles queriam — aquele que fora preso por revolta e homicídio — e entregou Jesus à vontade deles.
26Enquanto levavam Jesus, pegaram um certo Simão, de Cirene, que voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus. 27Seguia-o uma grande multidão do povo e de mulheres que batiam no peito e choravam por ele. 28Jesus, porém, voltou-se e disse: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos! 29Porque dias virão em que se dirá: ‘Felizes as mulheres que nunca tiveram filhos, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’.
30Então começarão a pedir às montanhas: ‘Cai sobre nós! e às colinas: ‘Escondei-nos!’ 31Porque, se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?” 32Levavam também outros dois malfeitores para serem mortos junto com Jesus. 33Quando chegaram ao lugar chamado “Calvário”, ali crucificaram Jesus e os malfeitores: um à sua direita e outro à sua esquerda.
34Jesus dizia: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” Depois fizeram um sorteio, repartindo entre si as roupas de Jesus. 35O povo permanecia lá, olhando. E até os chefes zombavam, dizendo: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!”
36Os soldados também caçoavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre, 37e diziam:“Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!” 38Acima dele havia um letreiro: “Este é o Rei dos Judeus”. 39Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: “Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!”40Mas o outro o repreendeu, dizendo: “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? 41Para nós, é justo, porque estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal”. 42E acrescentou: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado”. 43Jesus lhe respondeu: “Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso”.
44Já era mais ou menos meio-dia e uma escuridão cobriu toda a terra até as três horas da tarde, 45pois o sol parou de brilhar. A cortina do santuário rasgou-se pelo meio, 46e Jesus deu um forte grito: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”. Dizendo isso, expirou.
47O oficial do exército romano viu o que acontecera e glorificou a Deus, dizendo: “De fato! Este homem era justo!” 48E as multidões, que tinham acorrido para assistir, viram o que havia acontecido e voltaram para casa, batendo no peito. 49Todos os conhecidos de Jesus, bem como as mulheres que o acompanhavam desde a Galileia, ficaram a distância, olhando essas coisas. ( Lc 23, 1-49)


Até na hora a aparente derrota, o Sumo Bem sempre vence

Aos louvores da entrada triunfal de Nosso Senhor em Jerusalém logo se sucederam as dores da Paixão. Como explicar este paradoxo?

 A inexorável luta entre o bem e o mal


Reportemos a imaginação à eternidade, quando ainda não existia o tempo, pois Deus não havia criado o universo. Ele tinha diante de Si a possibilidade de criar infinitos mundos diferentes deste em que vivemos, mas, por uma livre escolha de sua vontade, não quis fazê-lo.’ Muitos dentre eles, aos nossos olhos de meras criaturas, poderiam ter sido melhores do que o existente, quiçá algum sem pecado e sem lutas...

Entretanto, o que Deus criou? Um universo cujas criaturas são boas e o conjunto delas é “muito bom” (Gn 1, 31). Logo no seu início, porém, todo esse bem criado passou a coexistir com o mal, a partir do momento em que a terça parte dos espíritos angélicos se uniu a Lúcifer numa revolta contra Deus (cf. Ap 12, 4). Ao brado de São Miguel, os Anjos fiéis se levantaram em oposição aos rebeldes e “factum est prælium magnum in Cælo — uma grande batalha se travou no Céu” (Ap 12, 7). Precipitado nas trevas eternas, o demônio tentou, como forma de manifestar sua obstinada oposição a Deus, desfigurar a beleza do plano da criação.

Invejando a criatura humana, que ainda se conservava inocente e desfrutava das delícias do Paraíso e da amizade com Deus, satanás se empenhou “em enganar os homens, para que não fossem exaltados e elevados ao lugar de onde ele caíra”.2 Tomando o aspecto de uma encantadora serpente, astuta e habilidosa para exacerbar as paixões humanas, entrou ele em contato com Eva e lhe propôs a desobediência a Deus. Eva cedeu e levou Adão a segui-la no mesmo caminho.

Por que a serpente entrou no Paraíso?

Ora, por que Deus deixou entrar a serpente no Paraíso e permitiu que o mal se estabelecesse na face da Terra? Entre outras razões, ressaltemos três: em primeiro lugar, a fim de nos enviar um Salvador que operasse a Redenção. Por isso, na Liturgia da Vigília Pascal se canta “ó culpa tão feliz que há merecido a graça de um tão grande Redentor!”.3 Em segundo lugar, para evitar o amolecimento e a tibieza dos justos. A existência dos maus é o melhor adestramento para os bons, que podem, na defesa do bem, praticar o heroísmo da virtude para a glória de Deus e seu próprio mérito. Por último, porque permitindo o mal, Deus quer um bem superior que dele resulta acidentalmente.4 Depois do pecado, por exemplo, o inferno foi criado para os anjos que ofenderam a Deus e para os homens pecadores que, permanecendo impenitentes, após a morte também para lá iriam. Brilha assim no universo a justiça infinita do Criador, premiando os bons e castigando os maus. Sem isto Ele não manifestaria sua justiça punitiva 5 nem transferiria ao universo o poder de castigar o mal que é praticado.

Uma luta estabelecida por Deus

Portanto, a partir do momento em que anjos e homens desobedeceram aos preceitos divinos, uma luta se iniciou entre o bem e o mal, entre os que procuram servir a Deus e os que se revoltam contra Ele, entre os que querem satisfazer suas paixões desregradas e aqueles que anelam viver do influxo da graça. Essa luta não tem trégua, pois foi estabelecida pelo próprio Criador: “Porei inimizades entre ti e a mulher, entre tua descendência e a dela” (Gn 3, 15). Luta tremenda, que atravessa os séculos com o enfrentamento constante de duas raças: a bendita estirpe de Jesus e Maria e a maldita linhagem de satanás.

Desde a expulsão do homem do Paraíso, vemos, então, como o filão dos maus parecia triunfar, pois o império do pecado na face da Terra, ao longo do Antigo Testamento, era quase universal. Através dos fios que tecem a História Sagrada, torna-se patente, mesmo entre o povo eleito, a ação deletéria deste filão de maus que, como denuncia sem véus Nosso Senhor, está involucrada nos crimes cometidos desde a morte de Abel até a chegada d’Ele (cf. Lc 11, 47-51). Ora, este aparente domínio do poder infernal teria fim com o cumprimento da promessa que Deus fizera aos nossos primeiros pais: “Ela te esmagará a cabeça” (Gn 3, 15).

Domingo de Ramos, início das dores

Com a Encarnação do Verbo a obra das trevas conheceu sua ruína. E o confronto entre o bem e o mal encontrará sua arquetipia, até o fim dos tempos, na luta implacável de Nosso Senhor contra os escribas e os fariseus, narrada longamente por todos os evangelistas. O maldito filão do mal encontrou diante de si um Varão que fundou uma Instituição para combatê-lo, o Homem-Deus diante do qual foi obrigado a ouvir as verdades mais contundentes e penetrantes, a ponto de ser-lhe arrancada a máscara da hipocrisia, aos olhos de todo o povo.

Na Liturgia do Domingo de Ramos vamos assistir ao desfecho dessa luta. Nesse dia a Igreja comemora, ao mesmo tempo, as alegrias da entrada triunfal de Nosso Senhor Jesus Cristo em Jerusalém e o início de sua Via Sacra, com a proclamação da Paixão no Evangelho da Missa. Abre-se, assim, a Semana Santa, talvez o período do Ano Litúrgico mais cogente, durante o qual as principais celebrações se sucedem, convidando-nos a considerar com especial fervor os acontecimentos que constituem o cerne de nossa Redenção.

Entrada triunfal em Jerusalém

Entre os numerosos milagres realizados pelo Divino Mestre, nenhum produzira tanta comoção em Israel quanto a ressurreição de Lázaro (cf. Jo 11, 1-44). A uma simples ordem, o morto de quatro dias saíra do túmulo andando, em perfeita saúde. Por evidenciar de forma tão grandiosa o poder divino de Jesus, o prodígio ocasionou um forte surto de fervor popular e muitos judeus passaram a crer n’Ele. Em contrapartida, tal fato acirrou ao extremo o ódio dos pontífices e fariseus. Reunido o Sinédrio, deliberou este acerca dos meios para fazer cessar a crescente fama de Nosso Senhor e, “desde aquele momento, resolveram tirar-Lhe a vida” (Jo 11, 53).

O Redentor, que tudo sabia, já tinha conhecimento desta decisão oficial do Sinédrio quando começou a viagem de volta à Cidade Santa, nas vésperas das comemorações da Páscoa. No caminho Ele advertira os discípulos a esse respeito, ao anunciar-lhes pela terceira vez a Paixão: “Eis que subimos a Jerusalém e o Filho do Homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes e aos escribas; condená-Lo-ão à morte e entregá-Lo-ão aos gentios” (Mc 10, 33). Contudo, nada fez para impedir a afluência das pessoas que acorriam ao seu encontro e passavam a segui-Lo durante o percurso. Eram israelitas em sua maior parte, os quais também se dirigiam ao Templo para celebrar a Páscoa, de modo que, quanto mais se aproximava da cidade, maior se tornava o número dos que O acompanhavam. Saindo de Jericó, por exemplo, registra São Mateus que “uma grande multidão O seguiu” (20, 29), e São João menciona outra “grande multidão de judeus” (12, 9) que se concentrou em Betânia ao saber que Jesus ali havia chegado. Toda essa gente foi com Ele a Jerusalém, pelo que “bem se pode supor que formavam o cortejo várias centenas, e até mesmo milhares de pessoas”,6 diz Filhon. É precisamente a essa altura do percurso, nas proximidades de Betânia e Betfagé, que se inicia o trecho de São Lucas recolhido para o Evangelho da Procissão do Domingo de Ramos do Ano C.

Os louvores começaram logo que Nosso Senhor montou o jumentinho, ainda na estrada. A sua passagem o povo ia estendendo os mantos no chão e completava esse improvisa do tapete com ramos colhidos das árvores (cf. Mt 21, 8; Mc 11, 8). Quando já se podia divisar o Templo — o que, segundo indicação precisa de São Lucas, corresponde a “perto da descida do Monte das Oliveiras” —, a multitudinária procissão irrompeu em exclamações e brados de alegria: “Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor! Paz no Céu e glória nas alturas!”. Tal movimentação pôs em alvoroço a cidade, que regurgitava de peregrinos vindos de todas as regiões da Palestina, os quais, saindo ao encontro de Jesus com ramos de palmas nas mãos, uniram-se à caravana, para também aclamá-Lo (cf. Jo 12, 12-13).

Esse cortejo triunfal mas quão modesto para Aquele que é Rei e Criador do universo! — realizava literalmente a profecia messiânica de Zacarias  “Dança de alegria, cidade de Sião; grita de alegria, cidade de Jerusalém, pois agora o teu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento, num jumentinho, filho de uma jumenta” (9, 9).

Continua no próximo post.

1) Cf. ROYO MARÍN, OP, Antonio.Diosysu obra. Madrid: BAC, 1963, p.143.
2) SANTO AGOSTINHO. Enarratio in psalmum LVIII, sermo II, n.5. In: Obras. Madrid: BAC, 1965, v.XX, p.489.
3) VIGILIA PASCAL. Proclamação da Páscoa. In: MISSAL ROMANO. Trad. Portuguesa da 2a. edição típica para o Brasil realizada e publicada pela CNBB com acréscimos aprovados pela Sé Apostólica. 9.ed. São Paulo: Paulus, 2004, p.275.
4) Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. I, q.19, a.9.
5) Cf. Idem, J-II, q.79, a.4, ad 1.
6) FILLION, Louis-Claude. Vida de Nuestro Señor Jesucisío Pasión, Mueev Resurrección. Madrid: Rialp, 2000. vIII. p.15.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Evangelho 5º Domingo da Quaresma - Ano C - 2013 - Jo 8, 1-11


Continuação dos comentários ao Evangelho V Domingo da Quaresma -  Ano C -  2013 - Jo 8, 1-11

Conclusão


Os acusadores foram julgados, a pecadora foi perdoada

Que magnífica lição de penitência, de perdão e da necessidade da perseverança, oferecida a cada um de nós neste vale de lágrimas no qual fomos concebidos e vivemos!


Jesus, o único que teria direito de lançar desde a primeira até a última pedra, concede à pecadora uma bela experiência da grandeza de sua misericórdia. Ali sentiu-se ela verdadeiramente amada pela infinita bondade de um Coração sagrado, humano e divino. E a felicidade que, de maneira equivocada, buscara no pecado, encontrou-a no perdão e na benquerença d’Aquele que os escribas e fariseus haviam escolhido para juiz: o Mestre. 

Aqueles que se apoiavam na Lei para acusar saíram julgados; a pecadora arrependida, que deveria ser morta, retirou-se na graça de Deus. Ninguém jamais foi ou será tão intransigente com o erro quanto Jesus; ninguém mais manso do que Ele para com os pecadores. 

Este é mais um dos episódios do Evangelho nos quais transparecem, de um lado, a infinita bondade do Sagrado Coração de Jesus, ardendo em chamas de desejo de perdoar, e, no extremo oposto, a dureza de alma dos escribas e fariseus, que não só rejeitam esse perdão, até para si próprios, mas jamais reconhecem com humildade suas respectivas faltas. 

Quando se defende a Lei por puro egoísmo, não só não se tem forças para praticá-la, como não se aceita a bondade!

quarta-feira, 13 de março de 2013

Evangelho 5º Domingo da Quaresma - Ano C - 2013 - Jo 8, 1-11


 Continuação dos comentários ao Evangelho V Domingo da Quaresma -  Ano C -  2013 - Jo 8, 1-11

9 A essas palavras, sentindo-se acusados pela sua própria consciência, eles se foram retirando um por um, até o último, a começar pelos mais idosos, de sorte que Jesus ficou sozinho, com a mulher diante d’Ele.

Essa narração contribui, ainda mais, para a probabilidade de estar relacionada a escrita no solo com os pecados de cada um dos acusadores. Não teria Jesus começado pelos mais velhos? Se o simples enunciado da sentença os tivesse convencido a todos, a desistência deveria ser coletiva e concomitante. O fato de se retirarem um a um indica que a conclusão de não ser conveniente ali permanecer, foi individual e sucessiva. Por outro lado, a ser verdadeira a interpretação de São Jerônimo e de Santo Ambrósio, não reconheceram aqueles homens suas faltas e delas não pediram perdão.

O pecado não compensa

 10 Então Ele Se ergueu e vendo ali apenas a mulher, perguntou-lhe: “Mulher, onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou?” 11 Respondeu ela: “Ninguém, Senhor”. Disse-lhe então Jesus: “Nem eu te condeno. Vai e não tornes a pecar

Ao notar a adúltera que seus acusadores iam-se retirando, começou a sentir crescente alívio em seu interior, atingindo um clímax após a saída do último deles. A perspectiva da morte por lapidação a amedrontara e promovera uma constatação freqüente nos pecadores arrependidos: o pecado não compensa! A grande vergonha e humilhação diante daquele numeroso público talvez a fizessem sofrer ainda mais.

A última terrível prova: o santíssimo olhar de Jesus. A Sagrada Face, íntegra em sua divina moralidade, a pureza e a virgindade em essência, sendo contempladas pelo delírio carnal envergonhado e arrependido... Só um ardoroso sentimento salvaria do merecido castigo aquela pobre alma: um pedido de perdão! Jesus não exigirá dela uma declaração explícita e formal, apenas lhe manifestará sua insuperável delicadeza: “Ninguém te condenou?”

Respeitando a Lei, Jesus é misericordioso

Com um procedimento tão sábio quanto inusitado, ninguém mais poderia acusar o Mestre de haver desconsiderado a Lei de Moisés e, portanto, de ter sido exageradamente indulgente. Ele não repetira senão a própria atitude dos fariseus e, ademais, Ele levara a pecadora a declarar: “Ninguém, Senhor”. Seguindo o exemplo de todos, Ele tampouco a condenaria.

Assim, “quebra o laço que Lhe armaram os caçadores” (cf. Sl 123, 7), confirma a Lei, faz rebrilhar sua dignidade, põe em fuga seus inimigos, produz maior admiração, respeito e submissão junto ao povo que O cercava e perdoa a pobre pecadora, despedindo-a com uma advertência: “Não peques mais”. Com essa admoestação, Ele ainda lhe concedia sua graça, sem a qual nenhuma virtude se pratica estavelmente.

Continua nos próximos posts.

terça-feira, 12 de março de 2013

Evangelho 5º Domingo da Quaresma - Ano C - 2013 - Jo 8, 1-11


Continuação dos comentários ao Evangelho V Domingo da Quaresma -  Ano C -  2013 - Jo 8, 1-11



Jesus eleva a questão do plano jurídico ao moral

7 Como eles insistissem, ergueu-Se e disse-lhes: “Quem de vós estiver sem pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma pedra”.

No Deuteronômio encontramos a clara obrigatoriedade de a primeira testemunha de um crime, punido com pena de morte, atirar a primeira pedra: “Tens, ao contrário, o dever de matá-lo:

Diante do Senhor se encontravam mestres da Lei e fariseus, peritos no domínio desses conhecimentos relativos à jurisprudência. Portanto, Jesus não se exime, pronuncia a sentença, mas, a propósito de sua execução, aproveita o ensejo para transferir a problemática do campo jurídico a um plano muito mais elevado, ou seja, o moral. Frase divinamente célebre, se ela fosse gravada de forma indelével em nossos corações, compenetrados estaríamos de nossa indignidade, de

nossas insuficiências, pecados, etc., e não seríamos ásperos com ninguém, nem repreenderíamos com dureza de coração os culpados. Doçura, humildade e compaixão constituiriam a essência de nosso relacionamento, e assim, atrairíamos a benevolência de Deus e seríamos causa de edificação do próximo. “Creio que Cristo quis criticá-los, e não só dava a entender que podiam pecar, enquanto homens, e que eram pecadores de fato — quer dizer, que estavam manchados de pecados como a generalidade dos homens — mas também que eram hipócritas: cheios de iniqüidade no interior, enquanto no exterior fingiam santidade e zelo religioso, tratando de apedrejar aquela mulher. Increpou-os como naquela outra ocasião em que os chamou de sepulcros caiados (Mt 23, 27). Feriu-os, portanto, no íntimo da consciência, ao dizer-lhes: ‘Quem de vós estiver sem pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma pedra’, dando a entender que eles eram réus daquele pecado ou de outros maiores. Mas essa acusação é tão prudente que não parece ser Ele quem a faz, mas a consciência de cada um deles. O Salvador os remete às suas próprias consciências, estabelecendo-as como juízes, como se Ele ignorasse o que nelas havia. De certo modo, é de direito natural que quem acusa ou condena alguém esteja livre do pecado que lhe reprocha” (8).

Pode um homem julgar outro homem?

É insuperavelmente magistral essa resposta de Nosso Senhor, pois não assume a função de juiz, que lhe ofereciam os escribas e fariseus, mas sim a de Mestre, conforme o título empregado por eles ao Lhe proporem o julgamento (v. 4). Como Altíssimo Conselheiro, Jesus lhes recorda que um juiz, apesar de seus pecados ou falhas, pode — e até deve — julgar e condenar, se necessário for; porém, levanta para eles um espinhoso problema: pode um pecador ser o executor da justiça de Deus?

O único, verdadeiro e competente Juiz é Nosso Senhor Jesus Cristo: “O Pai não julga ninguém, mas entregou todo o julgamento ao Filho” (Jo 5, 22). Todo aquele que de forma competente julga outro homem, por direito natural, positivo ou divino, assim o faz por delegação de Jesus Cristo. Entretanto, aquela sentença moral lançada contra homens orgulhosos que hipocritamente se julgavam santos e imaculados, de si não os deteria em sua determinação de cumprir a Lei, se esse fosse realmente seu objetivo exclusivo. Que mais faria Jesus para impedi-los?

Escrevendo, Jesus acusava os acusadores

8 Inclinando-Se novamente, escrevia na terra.

 Por mais que São Jerônimo não seja acompanhado pela maioria dos autores, parece ter ele inteira razão em sua análise a respeito deste ponto. Não cremos ser de boa linha a opinião de alguns comentaristas, de que Jesus escrevia sem um objetivo definido, como simplesmente querendo significar seu desinteresse pela questão levantada, ou para ganhar tempo. Tudo leva a crer que os pecados, dignos do mesmo castigo, cometidos pelos acusadores, figuravam naquela escrita aparentemente informal. Santo Ambrósio é também partidário desta hipótese de São Jerônimo.

Se assim de fato foi, Jesus procedeu com invariável sabedoria e, ademais, com suma bondade, pois poderia contra-acusar de público cada um deles, e não o fez. Muito pelo contrário, colocava-lhes à disposição seu total perdão. Bastaria um arrependimento interior e um pedido de misericórdia, ainda que implícito, para todos saírem daquela situação em inteira harmonia com Deus e até mesmo entre eles próprios. Jesus lhes oferecia essa grande oportunidade, mas...


Continua nos próximos posts.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Evangelho V Domingo da Quaresma - Ano C 2013 - Jo 8, 1-11


Continuação dos comentários ao Evangelho V Domingo da Quaresma - Ano C 2013 - Jo 8, 1-11



Os fariseus invocam uma lei em desuso

…multidão e disseram a Jesus: “Mestre, agora mesmo esta mulher foi apanhada em adultério. 5 Moisés mandou-nos na Lei que apedrejássemos tais mulheres. Que dizes Tu a isso?” 6 Perguntavam-Lhe isso, a fim de pô-Lo à prova e poderem acusá-Lo. Jesus, porém, Se inclinou para a frente e escrevia com o dedo na terra.

A expressão “apanhada em adultério” confere ainda mais substância à hipótese de um crime planejado por várias pessoas, com um intuito que se tornará explícito na revelação contida no versículo seguinte. Ademais, a afirmação fortemente categórica da parte deles evitava que fossem argüidos por Jesus a respeito das provas, pois nem a própria mulher procurava defender-se. Talvez, pela delicadeza de sua alma feminina, não insinuava sequer quem fosse seu cúmplice naquele crime.

Flávio Josefo, famoso historiador judeu daqueles tempos — portanto, de certo modo, insuspeito —, contanos que havia caído em desuso a lei que punia com pena de morte os réus condenados por esse tipo de crime.

Rigorismo em meio ao relaxamento geral dos costumes

Sob o reinado dos Herodes, a corrupção dos costumes em Jerusalém havia chegado ao extremo. Quiçá fosse essa uma circunstância que propiciasse aos fariseus e escribas criarem, junto a Jesus, o impasse de como proceder naquele caso de adultério. Seja como for, “sob as aparências de zelo pela Lei, aqueles homens hipócritas e rancorosos armavam para Jesus uma armadilha maldisfarçada. Estavam certos de que Aquele a quem chamavam ironicamente pelo epíteto de ‘amigo de pecadores e publicanos’ Se mostraria indulgente com a culpada; e então eles O acusariam de violar a Lei divina num ponto fundamental” (4).

Na mesma linha, comenta o Pe. Andrés Fernandez Truyols, SJ: “ pergunta, aparentemente respeitosa e até honorífica para Jesus, era na realidade insidiosa. Se Ele Se pronunciasse pelo castigo, tacha-Lo-iam de duro; se absolvesse, seria acusado de violar a Lei” (5). Por outro lado, vale a pena observar o contraste entre os fiéis, que ouvem enlevados as palavras do Salvador, e a sanha dos doutores da Lei e dos fariseus em condenar Jesus. “Enquanto os pacíficos e simples admiravam as palavras do Salvador, os escribas e fariseus Lhe faziam perguntas, não para aprender, mas para armar armadilhas à verdade” (6).

Querem tornar Jesus réu de sua própria sentença

Tornou-se famoso o dilema criado pelos fariseus a propósito do pagamento do imposto, se a César ou ao Templo. O “dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Mt 22, 21) marcou a História. Entretanto, o caso trazido a lume pela Liturgia de hoje foi montado com muitíssimo mais habilidade. Decidindo por uma ou outra solução, Jesus, ou se levantaria contra o poderio romano, ou se declararia discordante de Moisés e, portanto, do Sinédrio. Se sua sentença fosse no sentido de que lapidassem a mulher, na certa seus inimigos procurariam entregá-Lo a Pilatos por ter violado a lei imposta por Roma às províncias conquistadas e suas sufragâneas: o direito de vida e de morte lhe pertencia com exclusividade. Sem contar que teriam elementos para sublevar o povo contra sua radicalidade e intransigência.

Jesus contra Moisés...

Se Jesus a absolvesse, agitariam os fiéis pelo fato de Ele Se opor à Lei de Moisés e O arrastariam ao Sinédrio para ser excomungado e entregue à autoridade romana. Provavelmente, “queriam colocar Cristo em oposição à Lei de Moisés, dando a entender que O consideravam um outro Moisés, o qual trazia uma lei mais perfeita que a do primeiro. Tudo era feito para incentivá-Lo e provocá-Lo, de modo que Ele tomasse partido contra a Lei de Moisés, dando-lhes ocasião de acusá-Lo. Que dizes Tu a isso? Contrapondo-O a Moisés, como se O elevassem acima de Moisés. Tu, que és maior que Moisés, a quem não se aplicam suas leis, porque promulgas outra melhor e mais perfeita, o que dizes? Aprovas ou reprovas a sentença da lei mosaica? Por todos os meios, procuram colocá-Lo na tentação de dizer algo contra Moisés, em face de todo aquele público, já que O reconhecem como superior ao grande legislador” (7).

Jesus responde por escrito

Chama especialmente a atenção a inédita atitude do Divino Mestre, de inclinar-Se, permanecendo sentado, e pôr-Se a escrever “com o dedo na terra”. Jesus Se encontrava perto do pátio das mulheres, na galeria do Tesouro, e não sabemos de que maneira era constituído o piso desse local. Seja como for, provavelmente a escrita seria de molde a poder ser lida por outrem. Consideremos o fato de escribas e fariseus terem se postado perto de Nosso Senhor e, ainda mais, por se encontrarem de pé, não lhes era difícil ler os caracteres desenhados por Ele. Jesus escrevendo: é a única ocasião em que isso acontece em toda a narração dos Evangelhos. Como imaginar a forma das letras e a sequência das palavras? Evidentemente, só poderiam ser as mais belas entre todas as possíveis. Algo legível deveria restar no chão, talvez impresso sobre a própria poeira do caminho. O que teria escrito Ele naquele momento? Mais adiante trataremos desse pormenor.

Continua nos próximos posts.

domingo, 10 de março de 2013

Evangelho 5º Domingo da Quaresma - Ano C - 2013 - Jo 8, 1-11


Continuação do comentário ao Evangelho V Domingo da Quaresma Ano C 2013 Jo 8, 1-11



O episódio da mulher adúltera

1Dirigiu-se Jesus para o Monte  das Oliveiras.

Segundo nos diz Alcuíno (2), Jesus passava o dia pregando no Templo de Jerusalém e, ao entardecer, retornava a Betânia para repousar na casa de Lázaro. De acordo com este versículo, nessa ocasião, por ser a última tarde de festa, é possível que Jesus tenha passado a noite em oração, no Monte das Oliveiras. Quem melhor comenta esta passagem é o Pe. Andrés Fernandez Truyols, SJ: “Terminado o ministério apostólico de todo dia, tornado mais árduo pelas discussões às quais seus eternos adversários o obrigavam, que não lhe deixavam momento de repouso, enquanto seus ouvintes voltavam cada um para sua casa, Jesus se retirou para o Monte das Oliveiras. Não parece que se afastasse até Betânia, o que teria sido provavelmente indicado pelo autor. O mais certo é que passasse a noite numa tenda ou uma gruta; talvez naquela que foi considerada por muitos como a Gruta da Agonia ou, porventura, na que se encontra quase no topo do monte, e que a tradição consagrou como a cátedra dos ensinamentos de Jesus, sobre a qual Santa Helena edificou uma basílica. Desse modo, tanto de uma como da outra, Jesus podia dirigir-se rapidamente ao Templo pela porta oriental, que coincidiria mais ou menos com a hoje chamada Porta Dourada. De resto, o Monte das Oliveiras era um local familiar para Jesus” (3).

2 Ao romper da manhã, voltou ao Templo e todo o povo veio a Ele. Assentou-Se e começou a ensinar

Ninguém jamais poderá imaginar a irresistível força de atração exercida por Jesus em relação a quem viesse a conhecê-Lo. Disso dão uma ideia os Evangelhos, que constituem meras sínteses de maravilhas indescritíveis. Tal é seu empenho em fazer o bem que, logo ao raiar do dia, Ele vai ao Templo, certamente já seguido por outros pelo caminho. À sua entrada todos se juntam a seu redor para ouvi-Lo. Era o início de mais uma longa jornada de pregação conversada, na qual poderiam tomar parte ativa, com perguntas ou comentários, quaisquer dos presentes, numa atmosfera inteiramente amena e familiar. Por isso, Ele Se sentou e começou a ensinar. De repente, aquele sagrado convívio foi interrompido por um fato inusitado.

A adúltera é apresentada a Jesus

3 Os escribas e os fariseus trouxeram-Lhe uma mulher que fora apanhada em adultério. 4 Puseram-na no meio da multidão…

A adúltera foi colocada no centro da multidão, para ser julgada, como fautora de um crime e, dessa forma, ipso facto, constituíram a Jesus como juiz.

Esse fato, inevitavelmente, levanta uma importante questão: o que teria acontecido com o homem implicado na mesma falta? Qual a razão de ele não ter sido apresentado a Jesus, nessa ocasião? Ora, o texto da Escritura é peremptório sobre a obrigatoriedade da punição de ambos: “Se um homem cometer adultério com uma mulher casada, com a mulher de seu próximo, o homem e a mulher adúltera serão punidos de morte” (Lv 20, 10); ou ainda: “Se se encontrar um homem dormindo com uma mulher casada, ambos deverão morrer: o homem que dormiu com a mulher, e esta da mesma forma. Assim, tirarás o mal do meio de ti” (Dt 22, 22).

Várias hipóteses levantam os autores a esse respeito; não encontramos, porém, nenhuma que leve até ao extremo a desconfiança em relação à perfídia daqueles escribas e fariseus. Permitido nos seja, conhecendo a consumada maldade que lhes era característica, levantar uma suspeita sobre a “fuga” do infrator adúltero: não seria ele cúmplice de seus mandantes para, assim, conseguirem um flagrante? Neste caso, provavelmente, a adúltera teria sido induzida ao crime, deixando-se levar mais por ingenuidade e pela inclinação de suas paixões, do que por dolo.

Cabe aqui a pergunta clássica: “A quem aproveitou o crime?” Já na época de Daniel, os acusadores não haviam conseguido agarrar o suposto parceiro de Suzana no adultério caluniosamente inventado pelos dois juízes anciãos. E no caso do Evangelho de hoje, quem era o criminoso? A mulher teria se negado a declará-lo? Espanta-nos a facilidade com que os escribas e fariseus encontraram uma adúltera, para ser introduzida no Templo, bem àquela hora e em tal circunstância, tão favoráveis para armar uma cena show que envolvesse a Jesus.

Acrescente-se este outro dado: duas criaturas humanas, adultas, que fossem perpetrar um crime punido com pena de morte imediata, por mais primitivas que fossem, procurariam se proteger de qualquer risco de um flagrante. Ora, o caso em questão realizou-se em condições tais que dificilmente deixaria de ter sido planejado por terceiros, interessados em sua consecução.

Continua nos próximos posts.