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terça-feira, 19 de março de 2013

EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49 Ano C 2013


CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO  EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49  Ano C 2013

Nosso Senhor estava derrotando o mal

Os indiferentes e os tíbios, pretendendo pertencer ao número dos bons, estavam cegos de alma por sua própria atitude, a ponto de não perceberem que Nosso Senhor, em sua Via Dolorosa, alcançava o maior dos triunfos. Também os adversários do bem, com a vista turva de ódio, não se davam conta de que aceleravam sua própria ruína. “Ó morte onde está a tua vitória? Ó morte onde está teu aguilhão?” (I Cor 15, 55), indaga desafiante o Apóstolo. Morrendo na Cruz, o Divino Redentor vencia não só a morte mas também o mal, e deixava fundada sobre rocha firme uma instituição divina, imortal — a Santa Igreja Católica, seu Corpo Místico e fonte de todas as graças —, que enfraqueceu e dificultou a ação da raça da serpente, privando-a do poder esmagador e ditatorial que exercera sobre o mundo antigo.

Causa-nos júbilo saber que a aparente catástrofe da Paixão e Morte de Nosso Senhor marca a irremediável e estrondosa derrota de satanás. Este, insuflando os piores tormentos contra Jesus, iludia-se, julgando que caminhava para um êxito extraordinário contra o Bem encarnado. Em sua loucura não percebia como estava contribuindo para a glorificação do Filho de Deus e para a obra da Redenção.

Que glória, que triunfo, que fastígio atingira Nosso Senhor Jesus Cristo com sua Paixão! Que humilhação nos infernos, esmagados pelo erro de ignorar a força invencível do Bem!

A solução para o problema do mal

Na meditação da Liturgia do Domingo de Ramos encontramos o fiel da balança para o problema da luta entre o bem e o mal. Com a Encarnação, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, o mal sofreu sua derrota definitiva, porque passou a vigorar sobre a face da Terra o regime da graça. Foi este o meio determinado pela Sabedoria Divina para acabar com a vitalidade e o dinamismo da linhagem de satanás, o qual, inconformado, tudo faz para se vingar; por isso a luta entre o bem e o mal continua sem tréguas, hoje mais do que nunca.

Quanto a nós, católicos, não podemos ignorar tal realidade, na qual, aliás, estamos envolvidos. E devemos estar muito atentos para um aspecto de suprema importância: esse embate se trava também dentro de nós. Da mesma forma como no Paraíso Terrestre existia a serpente, em nosso interior há serpentes que fazem um trabalho muito mais ladino do que o demônio com Eva. São nossas más tendências, em virtude do pecado original, sempre de tocaia, esperando uma oportunidade para nos arrastar para o partido dos tíbios e indiferentes. Nessa batalha interna cabe-nos manter o mal amordaçado e humilhado, e dar ao bem toda a liberdade, o que só podemos alcançar com a graça de Deus.

Certo é que, quanto mais progredirmos na virtude, mais poderá se levantar contra nós uma acirrada oposição do poder das trevas. Dois mil anos de História da Igreja nos mostram com que facilidade essa oposição se transforma em ódio e em perseguição. Não temamos, entretanto, o que nos possa advir, certos de que, como diz São Paulo, “todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são os eleitos, segundo os seus desígnios” (Rm 8, 28). Avancemos, pois, seguros, com os olhos fixos n’Aquele que “se manifestou para destruir as obras do demônio” (I Jo 3, 8), pois quem é o diabo perto de Nosso Senhor?

O mal é limitado, o bem é intinito

Como ensina a filosofia perene, o mal é uma ausência de bem.9 O mal absoluto não existe, ao contrário do que pretendem as correntes dualistas. Sendo, pois, uma mera negação do bem, por si só não tem força para derrotá-lo.’10 Deus é o Sumo Bem, o Bem em essência, e quem se unir com integridade a Ele, portanto, se tornará invencível, como que revestido da própria onipotência divina.
Destas reflexões, nascidas da Liturgia que abre a Semana Santa, devemos tirar uma lição para os nossos dias, em que o mal e o pecado campeiam com arrogância pelo mundo inteiro: da luta entre o bem e o mal resulta necessariamente a vitória do bem, de mo do que, cedo ou tarde, os justos serão premiados e “farão brilhar como uma tocha a sua justiça” (Eclo 32, 20). No momento em que uma parte ponderável da humanidade vira as costas a seu Criador e Redentor, somos chamados a crer com firme confiança que, como Nosso Senhor triunfou outrora contra todas as aparências de derrota, triunfará de novo restabelecendo a verdadeira ordem: “No Senhor ponho a minha esperança, espero em sua palavra” (Sl 129, 5).  

segunda-feira, 18 de março de 2013

EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49 Ano C 2013


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O mal se coligou para matar Nosso Senhor

No relato da dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, um dos aspectos mais salientes é a união de todos os maus ao se depararem com o Sumo Bem encarnado. O Evangelho refere, por exemplo, que “naquele dia Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos” (Le 23, 12), causando-nos um espontâneo movimento de surpresa e indignação. Antigas rixas pessoais por questões políticas ficaram encerradas em função da condenação do Salvador. E uma regra da História que encontra aqui seu paradigma: os maus, ainda que hostis entre si, sempre juntam forças quando se trata de fazer face ao bem.

É verdade que Pilatos não agia motivado por ódio a Jesus e não O tratou com vulgar desprezo, como o fez Herodes, mas por receio de desagradar a César; e que em Herodes, mesclada com a curiosidade, predominava o sentimento de inveja. Certo é, porém, que eles se uniram contra o Homem-Deus quando seus caminhos se cruzaram. Da mesma forma, voluntária ou involuntariamente, se aliaram ao Sinédrio, contra o qual, todavia, ambos alimentavam antigos desacordos e inimizades.

Isso nos ensina como as desavenças entre os maus não alcançam, em geral, grande profundidade de alma, circunstância, aliás, posta em relevo pelo famoso comentário de Clemenceau, o astuto e anticlerical estadista francês, do fim do século XIX, entrando no XX: dois homens, por mais inimigos que sejam, se unem na cumplicidade caso frequentem as mesmas casas de tolerância. Podemos inferir desta afirmação que, pelo contrário, o ódio que dedicam ao bem, de modo especial quando este surge com muito esplendor, é inextinguível, e ambos entram numa conjuração para destruí-lo.

Entre os maus, há graus de perversidade que originam indecisão ou lentidão. Quando Nosso Senhor se encontrava perante Herodes, “os sumos sacerdotes e os mestres da Lei estavam presentes e O acusavam com insistência” (Le 23, 10); ante a dúvida de Pilatos, uma vez mais “os chefes dos sacerdotes faziam muitas acusações contra Jesus” (Mc 15, 3), pressionando o governador com argumentos falazes. Por fim, ao ser proposta a libertação de Jesus, “os chefes dos sacerdotes atiçaram a multidão para que Pilatos soltasse Barrabás” (Mc 15, 11) e por isso o povo insistia gritando “com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles aumentava sempre mais” (Lc 23, 23). Sua histeria não diminuiu enquanto o Divino Prisioneiro não foi entregue “à vontade deles” (Le 23, 25).

Ódio dos maus, indiferença dos bons

Nessas horas, lamentavelmente, muitos daqueles que se têm na conta de virtuosos não abraçam com decisão e coragem o partido do bem, permitindo, por isso, a expansão do domínio do mal. “Esta é a vossa hora e do poder das trevas” (Lc 22,53), lamentava-se o Salvador no momento de ser preso, sem que ninguém dentre os seus mais próximos tomasse sua defesa de maneira eficaz. Boa parte dos que haviam aclamado Jesus na entrada em Jerusalém com ramos e brados, por não terem aderido com profundidade ao Bem, estavam mais tarde no meio da multidão vociferante votando por Barrabás.

Não nos custa admitir que na turba que exigia a condenação do Senhor estivesse alguém a quem Ele houvesse restituído a vista, e que não reagia diante do infame espetáculo; outro a quem Ele tivesse devolvido a audição e a fala, e que ouvia aquelas blasfêmias sem levantar a voz para protestar; outro, ainda, ao qual Ele houvesse curado da paralisia e que tivesse caminhado até ali apenas para saciar sua malsã curiosidade, assistindo impávido ao sofrimento de quem o beneficiara. Talvez muitos não quisessem que Nosso Senhor fosse crucificado, mas, por se terem deixado influenciar pelos maus, acabaram participando do pior crime já cometido na História. Todos, contudo, eram indiferentes, quando não hostis ao Divino Mestre.

Para evitar que também nós nos transviemos, seja no caminho da tibieza e da indiferença, seja no da ingratidão e da traição, devemos progredir com firmeza nas vias da santidade e cultivar nossa indignação ante o avanço ousado dos que recusam a Jesus. Sempre que os bons não entram pelas sendas da radicalidade, o mal leva a melhor.

Cabe aqui remover uma objeção no tocante à virtude da humildade: não será melhor e mais conforme aos ensinamentos de Nosso Senhor que os bons sejam humildes e resignados? A resposta é afirmativa no tocante a injúrias feitas a nós mesmos. Porém não é acertada se o alvo das agressões injustas forem as coisas sagradas, a Santa Igreja Católica ou alguma pessoa inocente. Em tal caso, manter-se passivo é repetir a atitude dos que assistiram com indiferença aos sofrimentos de Jesus Cristo.8

É sublime o exemplo que Nosso Senhor nos dá despojando-Se de Si mesmo e aceitando todas as injúrias por nossa salvação. No entanto, ao mesmo tempo precisamos aprender a lição de que, em certas circunstâncias, a indiferença pode constituir um pecado maior do que o ódio, O contrário seria uma atitude semelhante a alguém que, sendo assaltado por um ladrão em sua própria casa, assistisse com indiferença e de braços cruzados às piores agressões contras seus familiares mais próximos. Seria esta atitude própria a um bom pai, filho ou esposo? Assim, na Paixão de Nosso Senhor o que mais chama a atenção não é a sanha dos inimigos, mas a indiferença dos bons. E este um aspecto esquecido, ainda que da maior importância, que cumpre ser lembrado hoje.

Continua no próximo post.

8) Cf. SAO TOMÁS DE AQUINO, op. cit., II-II, q.188, a.3, ad 1.

domingo, 17 de março de 2013

EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49 Ano C 2013


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Inteira conformidade com a vontade do Pai

Ora, até então Nosso Senhor sempre evitara qualquer homenagem ostensiva à sua realeza, impondo silêncio àqueles que reconheciam n’Ele o Salvador. No momento em que o povo quis proclamá-Lo rei, logo após a primeira multiplicação dos pães, Ele Se havia esquivado, retirando-Se sozinho para um monte (cf. Jo 6, 15). Na entrada em Jerusalém neste dia, pelo contrário, aceitou com inteira naturalidade as honras e aplausos. Tal atitude, além de permitir que as pessoas por Ele beneficiadas manifestassem sua gratidão de maneira formal, tinha em vista também a Paixão, pois era preciso ficar notório e testemunhado pelo próprio povo que o Crucificado era o descendente de Davi por excelência, o Messias esperado.

Vemos aqui ressaltada a plena conformidade de Nosso Senhor com a vontade do Pai. Quando Lhe foi pedido o apagamento, o Divino Redentor o abraçou por completo: nasceu numa Gruta da pequena Belém e recebeu tão somente a adoração dos pastores e dos Magos vindos de terras longínquas. A única reação de Jerusalém à notícia de seu nascimento fora a perturbação (cf. Mt 2, 3), e nenhum de seus habitantes saíra à procura do rei dos judeus recém-nascido para Lhe prestar homenagens.

Entretanto, chegado o momento propício de sua glorificação pelos homens, Ele acolheu com benevolência os brados que O proclamavam Rei de Israel, assim como, durante anos, aceitara ser chamado de “filho do carpinteiro” (Mt 13, 55). Na resposta à insolente interpelação dos fariseus pedindo-Lhe que censurasse seus aclamadores, Jesus deixou bem claro ser esse triunfo a realização de um desígnio divino, o qual se cumpriria mesmo se os homens se negassem a louvá-Lo: “Eu vos declaro: se eles se calarem, as pedras gritarão”.

Triunfo prenunciador da Paixão

Um detalhe da cerimônia litúrgica indica outro aspecto do Domingo de Ramos, sem o qual não nos seria possível entender seu significado mais profundo: o sacerdote celebra revestido dos paramentos vermelhos, cor própria à comemoração dos mártires.

Devido à sua personalidade divina, para Nosso Senhor tudo é presente, tanto o passado quanto o futuro. Por conseguinte, Ele via que dentro de alguns dias, uma vez mais, estrugiriam nas ruas de Jerusalém brados bem diferentes dos que então O reconheciam como Filho de Davi. Diante de Pilatos, o populacho vociferaria pedindo sua crucifixão e a libertação do vulgar bandido, Barrabás. A esse respeito, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira faz uma observação: “Os pintores católicos que reproduziram a cena apresentam Nosso Senhor recebendo com certo bom grado aquela homenagem, mas com um fundo de tristeza e ao mesmo tempo de severidade, porque Ele compreendia o que aquilo tinha de vazio, e que o povo que O aclamava, sem pensar nisso, reconhecia a sua própria culpa. [...] Ele desfila bondoso e triste; Ele sabe o que O espera”.7

O triunfo de Jesus em Jerusalém não era senão o prenúncio de seu martírio na Cruz. Os evangelistas, sempre muito sintéticos, tiveram especial diligência ao consignar a Paixão de Cristo, acontecimento de importância ímpar na História. E por isso que o Evangelho da Missa deste domingo excede em extensão o habitual dos demais, o que impossibilita comentar cada um de seus versículos no exíguo espaço de um artigo. Façamos, então, uma reflexão que nos coloque na adequada perspectiva para contemplar as maravilhas oferecidas pela Liturgia do Domingo de Ramos, de modo a obtermos os melhores frutos para nossa vida espiritual.

Continua no próximo post.

7) CORREA DE OLIVEIRA, Plinio. Palestra. São Paulo, 14 abr. 1984.