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segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A conversa noturna com Nicodemos IV Jo 3, 14-21

Continuação dos comentários do Evangelho Jo 3, 14-21
Jesus prepara as mentalidades para a aceitação do dogma
Resta dizer uma palavra sobre a expressão “o Filho do Homem”, que aparece 82 vezes ao longo dos Evangelhos, quase sempre saída dos adoráveis lábios de Jesus e, ademais, exclusivamente aplicada a Ele. O Antigo Testamento traz à tona essa mesma expressão, ora referindo-se a um simples homem, ora a um ser sobrenatural superior a um homem comum (5).
No Cristo nós encontramos a misteriosa união de duas naturezas— a divina e a humana — numa só Pessoa. Era indispensável ir preparando as mentalidades para a aceitação, com base na fé, desse altíssimo dogma. Hoje — depois de dois milênios, com toda a tradição e o grande desenvolvimento doutrinário da Teologia — temos mais facilidade para abraçar essa fundamental verdade revelada. Contrariamente, naqueles tempos, a cultura religiosa prognosticava uma figura messiânica muito diferente. O Messias deveria ser um grande condestável de nacionalidade judaica que daria ao seu povo a supremacia sobre todas as outras nações, libertando-o de qualquer ônus, submissão ou tributo. Sobretudo naquele momento em que os judeus estavam subjugados política e tributariamente ao Império Romano, o termo “Messias”, lançado ao ar, colocava em movimento uma dinâmica cadeia de sentimentos nacionalistas.
Sapiencial emprego da expressão “Filho do Homem”
Como então utilizar a linguagem humana para aproximar as inteligências da aceitação de um dos mais altos dogmas de nossa Fé? Dizer-se simplesmente “Filho de Deus” não resolveria o problema e até poderia conduzir o povo judeu, tradicionalmente crente em um só Deus, a uma enorme perplexidade: aceitar a existência de um Deus-Homem! Foi, aliás, o que mais tarde aconteceu: “Murmuravam então d’Ele os judeus, porque dissera: ‘Eu sou o pão que desceu do céu’. Diziam: ‘Porventura não é este aquele Jesus, filho de José, cujo pai e mãe nós conhecemos? Como, pois, diz Ele: Desci do céu?’” (Jo 6, 41-42).
Daí ser muito sapiencial o emprego da expressão “Filho do Homem”. Ela permitia ao ouvinte situar-se a qualquer altura de seu grau de fé. Se se tratasse de um puro naturalista, seu juízo sobre Jesus seria meramente humano, sem discernir sua divindade, e essa expressão o deixaria tranquilo. Se, pelo contrário, se tratasse de um grande místico, a natureza divina deixaria seus reflexos refulgirem sobre a humanidade de Jesus e, nesse caso, a expressão em questão seria tida como mais uma manifestação da humildade de Jesus. Essa é a constante encontrada em não poucas páginas da Hagiografia: vemos os santos fazendo uso de uma linguagem não inteiramente explícita ou categórica, a fim de evitar perplexidades em seus ouvintes, muitas vezes até em seus próprios discípulos.
Por aí se entende quanta delicadeza Jesus empregou nessa conversa com Nicodemos, ao fazer uso da figura da serpente levantada por Moisés no deserto, aproximando-a metaforicamente à do Filho do Homem, “a fim de que todo aquele que crê n’Ele tenha a vida eterna”. Pronto já estava aquele bom fariseu a aceitar a afirmação contida no versículo logo a seguir.
Continua no próximo post

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