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sábado, 20 de abril de 2013

Evangelho 5º Domingo da Páscoa Ano C Jo 13, 31-33a.34-35


Comentário ao Evangelho – V domingo da Páscoa Jo 13, 31-33a.34-35

31 Depois que Judas saiu do cenáculo, disse Jesus: “Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele. 32 Se Deus foi glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo, e o glorificará logo.
33a Filhinhos, por pouco tempo estou ainda convosco. 34 Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. 35 Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros” (Jo 13, 31-33a.34-35).
No sofrimento, a raiz da glória

Embora constatemos a instintiva repugnância de nossa natureza em relação a todo sofrimento, é nele que se encontra a porta da autêntica felicidade. E no amor ao próximo o sinal característico do cristão.
A harmonia da natureza humana no Paraíso
Nossa vida na face da Terra pode ser definida como uma grande prova, pois viemos a este mundo para enfrentar uma existência tisnada pelo pecado, repleta de dificuldades, e só se formos fiéis às graças recebidas obteremos o prêmio da eterna bem-aventurança. A prova é posta pelo Criador no caminho de todos os seres inteligentes, e nem sequer os Anjos foram chamados à visão beatífica sem passar por ela.1 Adão e Eva, nossos primeiros pais, tinham sido introduzidos no Paraíso, em graça, também para serem experimentados e não foram fiéis. Ao romper a obediência e comer o fruto proibido, foram expulsos do Éden e privados de muitos dos privilégios concedidos por Deus quando viviam em estado de justiça, dentre os quais a ciência infusa, que dava o conhecimento dos segredos da natureza, a impassibilidade, pela qual não adoeciam, e o magnífico dom de integridade.
O dom de integridade
Esse dom especialíssimo fazia com que todas as inclinações das paixões e os impulsos da natureza estivessem em harmonia com a lei divina.2 A sensibilidade e a vontade eram governadas pela razão perfeitamente equilibrada, e esta se submetia com docilidade às determinações de Deus. A ordenação do homem antes do pecado poderia ser comparada a um motor afinado, sem nenhum parafuso frouxo, ou a um crochê muito bem feito, sem nenhum ponto solto; em todos os movimentos de alma e de corpo reinava o mais completo equilíbrio, sem nenhum esforço. Com o dom de integridade jamais derramaríamos uma lágrima, não teríamos dores ou sofrimentos de qualquer tipo, e o drama não se apresentaria em nossas vidas, pois tudo seria conforme a ordem estabelecida pelo Criador.
Só conhecendo de perto Nosso Senhor e Nossa Senhora poderíamos ter uma ideia exata de tal privilégio, já que ambos o possuíram desde o primeiro instante da concepção, por não haver passado por Eles nem sequer a sombra da mancha do pecado. Em Jesus encontramos esse dom em grau infinito, pois n’Ele todas as ações humanas são reflexo das divinas, em consequência da união indestrutível entre ambas as naturezas. Esta graça de união faz com que Ele, mesmo enquanto Homem, seja intrínseca e absolutamente impecável, e que todo o seu Corpo e até o menor de seus movimentos sejam santos de maneira infinita.3 No caso de Nossa Senhora, pura criatura humana divinizada pela graça, reconhecemos esse dom por não haver n’Ela nenhum movimento desordenado.
Onde está a origem da necessidade do dom de integridade para o homem? No fato de ser ele um microcosmo, contando em sua natureza com elementos do reino mineral, vegetal, animal e espiritual, aos quais se acrescenta uma participação na vida divina, pela graça. Estes elementos trazem leis contraditórias que, devido ao pecado, se entrechocam em nosso interior. Por exemplo, se por um lado o elemento espiritual pede uma dedicação cada vez maior aos impalpáveis e ao sobrenatural, a lei animal se esquiva dessa tendência, chamando nossa atenção para o que é concreto e material. Enquanto o Mandamento de Deus ordena não cobiçar as coisas alheias, nossos instintos nos induzem à apropriação daquilo que nos agrada, embora não nos pertença. Os exemplos poderiam ser indefinidamente multiplicados, pois há uma luta constante entre as várias leis que originam as dificuldades desta vida e causam tormento, perplexidade e dor. Eis a razão de São Paulo afirmar: “No meu íntimo, eu amo a Lei de Deus; mas percebo em meus membros outra lei que luta contra a lei da minha razão e que me torna escravo da lei do pecado que está nos meus membros” (Rm 7, 22-23). É o preceito de Deus a exigir do Apóstolo um determinado comportamento, enquanto o instinto o leva a tomar atitudes em sentido oposto. Esse é o drama do ser humano na face da Terra.
Por isso, querer programar uma vida sem sofrimento é algo impossível, pois não há ninguém livre de contrariedades. Não obstante, é factível compensar a ausência desse dom, fazendo com que, de alguma maneira, seus efeitos se operem em nossas almas?
Regressar às vias do dom de integridade
A solução se encontra em um fator a respeito do qual houve quem ousasse aproximá-lo ao gênero dos sacramentos,4 quiçá um “oitavo sacramento” — acrescentando de forma analógica um novo componente ao definitivo septenário que a doutrina católica nos ensina —, e este é o sofrimento. Há na alma humana, de fato, uma aptidão que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira designava como “sofritiva”, que consiste em “uma como que capacidade e necessidade de sofrer”.5 Da mesma forma que os nossos músculos precisam ser exercitados para não definhar, assim também nós — uma vez expulsos do Paraíso e perdido o dom de integridade — precisamos passar pelo exercício do sofrimento para que este equilibre nossa natureza desordenada. E quando nossa faculdade de sofrer “não se esgota pelo sofrimento efetivo, acaba determinando uma frustração maior que faz sofrer mais do que o sofrimento. O modo menos sofrível de levar a vida consiste em sofrer. Uma das razões profundas dos desequilíbrios modernos é que as pessoas não sofrem, porque acabam estabelecendo a ideia de que é possível levar uma vida sem sofrimento”.6 Numa palavra, é a dor que faz do homem uma criatura ditosa nesta vida de estado de prova. Tal doutrina parece muito difícil de ser admitida, pois nossa natureza não pode rejeitar a felicidade e está a cada instante à sua procura. No entanto, já os filósofos pagãos intuíram, pelo simples recurso à razão e à lógica, o papel da dor na vida humana. “Julgo-te um desgraçado se nunca o foste: passaste a vida sem ter contrariedade; ninguém (nem mesmo tu) conhecerá até onde alcançam tuas forças”,7 chegou a afirmar Sêneca.
Deus, que nos criou ávidos de encontrar a felicidade, também colocou em nossa alma a capacidade de sofrer. Qual a razão para este divino modo de agir? É o que nos ensina com grande profundidade a Liturgia do 5º Domingo da Páscoa.

Continua no próximo post

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