Comentário ao Evangelho – II domingo da Quaresma – Mt 17, 1-9 – Ano A – 2014
Gozo: a posse do bem desejado
Dessa
visão de Deus face a face e desse amor recíproco entre mim e Ele, redundará um
eterno e indescritível gozo, pois quando tomo posse de um objeto sempre muito
desejado por mim, torno-me feliz. Enquanto ele não me pertence, eu me consumo
por obtê-lo. Ao recebê-lo por minha propriedade definitivamente, nele repouso e
dele desfruto. Nisso consiste a felicidade. Quanto melhor for o objeto e maior
sua duração, proporcionalmente mais intenso será o meu gozo daí resultante. O
ser humano, na essência de seu espírito, especificamente é inteligência e amor.
No Céu, o desejo de conhecer se satisfaz de forma plena na visão da Verdade,
Bondade e Beleza, ou seja, do próprio Deus. E a ânsia de amar e ser amado se
aplaca inteiramente, pois não só amaremos a Deus, mas seremos cientes e
experientes de todo o amor que Ele nos tem. E, ademais, eternamente vendo
aspectos novos do Ser Absoluto e Infinito, acrescidos pelo insuperável convívio
de Jesus em Sua santíssima humanidade, da Virgem Maria, nossa Mãe, dos anjos e
dos santos.
O que é o Céu?
Esse é
o Céu, “o fim último e a realização de todas as aspirações mais profundas do
homem, o estado de felicidade suprema e definitiva” 6; e essa é a glória que
transparece no Tabor, ao transfigurar-Se o Senhor. Manifestou aos três
Apóstolos a clareza de Sua alma e de Seu corpo para animá-los, em função da
glória final, a percorrerem o espinhoso e dramático caminho do Calvário e, com
fortaleza de alma, aceitarem o futuro martírio no epílogo de suas vidas.
Com
esse fundo de quadro, analisemos o Evangelho deste Segundo Domingo da Quaresma.
A Transfiguração do Senhor
Seis dias depois, tomou Jesus consigo
Pedro, Tiago e João, seu irmão, e levou-os à parte a um monte alto [...]
São
Lucas fala em oito dias. Será mais fácil compreender quão aparente é essa
discrepância se levarmos em conta que um evangelista considera o dia de saída e
o de chegada, enquanto Mateus só se refere aos intermediários, como nos explica
São Jerônimo7. O “depois” toma como referência a cena da confissão e primado de
Pedro, na Cesaréia. Dali partem rumo ao Monte Tabor que dista aproximadamente
80 km, situado nos confins da Galiléia e da Samaria. O Divino Mestre se
comprazia com o alto das montanhas, e ali procurava prodigalizar Seus grandes
mistérios.
Nesse
caso concreto, escolheu o Tabor talvez para simbolizar a necessidade de
elevarmos nossos corações sobre as coisas deste mundo e, em conseqüência, mais
facilmente nos entregarmos à meditação das verdades eternas e delas tirarmos
todo proveito, conforme as palavras de São Remígio: “Com isto o Senhor nos
ensina que é necessário, para quem deseja contemplar a Deus, não se deixar
atolar nos baixos prazeres, mas elevar a alma para as coisas celestiais, por
meio do amor às realidades superiores. Ensina ainda a Seus discípulos que não
devem procurar a glória de sua beatitude divina nas regiões inferiores do
mundo, mas sim no reino da beatitude celestial. E são levados separadamente
porque todos os santos estão apartados, com toda a sua alma e pela direção da
fé, de qualquer mancha, e serão radicalmente separados nos tempos vindouros; ou
também porque muitos são os chamados e poucos os escolhidos” 8.
Os
comentários se multiplicam a propósito da razão de ter Jesus escolhido esses
três Apóstolos para gozarem do convívio glorioso do Senhor. Um motivo claro e
imediato salta logo aos olhos: estes veriam mais de perto as humilhações pelas
quais passaria o Salvador. Como também era fundamental haver algumas
testemunhas da glória de Jesus para sustentarem, na prova da Paixão, os
Apóstolos em suas tentações.
Apartar-se
das criaturas é condição indispensável para entrar em contato com Deus e, mais
ainda, para vê-Lo.
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