Continuação dos comentários ao Evangelho – Mt 13, 1-23 – XV Domingo do Tempo Comum –Ano A
O perigo do endurecimento de coração: uma fé fraca
18 “Ouvi, portanto, a parábola do semeador: 19 Todo
aquele que ouve a palavra do Reino e não a compreende, vem o Maligno e rouba o
que foi semeado em seu coração. Este é o que foi semeado à beira do caminho”.
Na beira do caminho
não encontramos uma terra arada, preparada para receber a semente, mas, pelo
contrário, um solo duro e estéril. Quando o grão cai num local assim, nada
produz, e acaba servindo de alimento aos pássaros.
Isso é o que ocorre
com as almas que deram as costas a Deus e apegaram-se desordenadamente às
criaturas. Nesses pecadores o coração fica endurecido como a terra batida pelos
passos dos caminhantes; sua fé torna-se insuficiente, a palavra divina não
penetra no interior deles, porque a ouvem com displicência, “como se nada
tivessem a ver com o que se diz: não entram em seu coração, não examinam seus
costumes, não refletem se porventura aquilo tenha sido dito para eles”.7 Esses,
portanto, estão despreparados para aproveitar as palavras de Deus.
A superficialidade impede a palavra de vingar
20 “A semente que caiu em terreno pedregoso é aquele que
ouve a palavra e logo a recebe com alegria; 21 mas ele não tem raiz em si
mesmo, é de momento: quando chega o sofrimento ou a perseguição, por causa da
palavra, ele desiste logo”.
Outras sementes caíram
entre os pedregulhos e chegaram a germinar, mas as plantas não conseguiram
formar raízes, por insuficiência de terra, e logo secaram. Esse terreno
representa a inconstância de coração, a superficialidade de espírito daqueles
que ouvindo a palavra de Deus, por vezes até com verdadeiro encanto, logo se
distraem com alguma banalidade. Em tais almas, as graças recebidas, não
conseguem se arraigar.
Quando começamos a
trilhar as vias da virtude, em geral, por especial misericórdia divina, os
primeiros momentos são acompanhados de grandes graças sensíveis que nos enchem
de entusiasmo e encanto. Mais tarde, contudo, o vento das provações nos sacode
e a aridez nos invade. Trata-se então, uma vez que ouvimos e compreendemos a
palavra, de continuarmos firmes no caminho, enfrentando a tempestade interior,
agindo durante a insensibilidade como se estivéssemos no tempo da consolação.
Nisso consiste a fidelidade à palavra de Deus.
O apego às coisas do mundo asfixia a palavra
22 “A semente que caiu no meio dos espinhos é aquele que
ouve a palavra, mas as preocupações do mundo e a ilusão da riqueza sufocam a
palavra, e ele não dá fruto”.
Os espinhos
representam o apego ao dinheiro e aos bens deste mundo.
Todo homem, afirma
Bento XVI, “tem em si uma sede de infinito, uma saudade de eternidade, uma
busca de beleza, um desejo de amor, uma necessidade de luz e de verdade que o
impelem rumo ao Absoluto; o homem tem em si o desejo de Deus”.8
Se a alma não se
volta para Deus — o Único que a pode satisfazer por inteiro —, essa apetência
se desvia para as riquezas materiais que nunca preencherão seu anseio do
absoluto. Bem a propósito nos adverte São Gregório Magno, a respeito dessas
ilusórias riquezas: “São enganosas porque não podem permanecer sempre conosco;
são enganosas porque não podem satisfazer as necessidades de nosso coração”.9
Assim, quem tem
desproporcionada preocupação com os bens materiais, a ponto de preferi-los aos
valores sobrenaturais, está pronto para sufocar a palavra divina. É, por
exemplo, o defeito daquele que se esforça apenas em cuidar de seus negócios.
Quando recebe a palavra, no primeiro momento sente-se por ela atraído, mas logo
se deixa absorver por completo pelo apego ao mundo. Como sua atenção está
centrada na posse dos bens terrenos, e não na sua própria santificação, os
espinhos das ambições mundanas crescem e sufocam a palavra.
Essa é a semente que
cai no espinheiro do apego ao dinheiro. Nada produz!
A palavra bem recebida
23a “A semente que caiu em terra boa é aquele que ouve a
palavra e a compreende. Esse produz fruto”.
A semente que caiu em
terra boa e se desenvolve é figura daquele que ouve a palavra de Deus com
entusiasmo e depois toma a decisão séria de mudar de vida, abandonando o
pecado, a superficialidade de espírito e os apegos desordenados; ou seja, rompe
de fato com tudo quanto significa terra endurecida, pedregulho ou espinho, e
entrega-se inteiramente à prática da virtude. Esse sim produz todos os frutos!
Ensina-nos São Tomás
que os ouvintes da palavra de Deus devem ser humildes, à semelhança da terra,
mas também firmes pela retidão de espírito; devem igualmente ser fecundos como
a terra para que neles frutifiquem as palavras recebidas da sabedoria.
Requer-se humildade para ouvir, integridade para julgar aquilo que se ouviu, e
fecundidade para tirar muitas consequências das poucas coisas ouvidas.10
Um consolo para o apóstolo
23b “Um dá cem, outro sessenta e outro trinta”.
O Divino Redentor faz
questão de frisar a diversidade de frutificação da semente da palavra nas
almas: trinta, sessenta e cem por um. Uma demonstração a mais de que Deus tudo
cria em hierarquia. Uns são chamados a dar trinta, de outros o Senhor exigirá
cem, ou talvez mais, conforme a quantidade de dons concedidos a cada um. “A
quem muito se deu, muito se exigirá” (Lc 12,48), adverte-nos o Divino Mestre.
Isso não nos deve
atemorizar. Pelo contrário, o fundamental é termos confiança no auxílio de
Deus, cuja graça nunca nos falta, e estarmos seguros de que, quando Ele age em
nós e nós correspondemos com generosidade, o resultado supera largamente toda
expectativa. Em nossas atividades apostólicas, tenhamos, portanto, essa fé: se
é obra de Deus, em determinado momento haverá uma expansão na proporção de,
pelo menos, trinta, ou sessenta ou até cem por um. E nas horas de sucesso, não
nos esqueçamos de que tudo vem de Jesus, pois Ele próprio é o semeador.
Lembremo-nos de suas palavras: “Sem Mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5).
Continua no próximo post
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