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segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Evangelho Solenidade da Assunção de Nossa Senhora – Lc 1, 39-56

Continuação dos comentários ao Evangelho Solenidade da Assunção de Nossa Senhora – Lc 1, 39-56
Cristo ressuscitado, fundamento de nossa fé
Já na segunda leitura escutamos a voz de São Paulo, o arauto da Ressurreição, dirigindo-se aos Coríntios (I Cor 15, 20-27a).
Quis a Providência que ele desenvolvesse boa parte de seu apostolado entre os gregos, povo que não admitia a ressurreição dos corpos no último dia, porque se a aceitassem tornar-se-ia forçoso reconhecer a existência de uma vida post mortem, em função da qual deveriam seguir a moral. Como eles não estavam dispostos a assumir um comportamento íntegro, deixaram-se rolar precipício abaixo impelidos pelo vício da impureza. Sua depravação de costumes ficou conhecida na História. A eles São Paulo declara em um versículo anterior: “Se Cristo não ressuscitou, vã é nossa pregação e vã é também vossa fé” (I Cor 15, 14).
Dada a firme convicção que caracteriza sua doutrina acerca deste mistério, somos levados a crer que o Apóstolo tenha tratado com o próprio Nosso Senhor a respeito disto, que lhe terá fornecido elementos claríssimos para sustentar tal verdade. Por isso, diz importar-se pouco com o sofrimento, a alegria ou com qualquer circunstância adversa, pois nada pode separá-lo de Cristo (cf. Rm 8, 35), considerando a morte como um lucro (cf. Fl 1, 21) e um meio para unir-se ainda mais ao Salvador. De fato, São Paulo deposita uma esperança extraordinária na ressurreição, do que dão testemunho suas epístolas, nas quais encontramos a cada passo alguma referência a este grandioso acontecimento.
Precedidos por um membro eminente do Corpo Místico
O ensinamento paulino a respeito da ressurreição, que procura nos estimular à esperança — “Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram” (I Cor 15, 20) —, pode ser aplicado com propriedade também a Nossa Senhora. A partir do momento em que o Redentor constituiu seu Corpo Místico, do qual Ele é a Cabeça, não se compreenderia que só Ele ressuscitasse, pois seu desígnio consiste em abrir o caminho para o Corpo inteiro gozar do mesmo benefício. Caso Nosso Senhor ressurgisse dos mortos e todos os membros da Igreja triunfante permanecessem no Céu apenas em alma, mesmo após o Juízo Final, esta seria uma obra disforme, pouco condizente com o seu modo divino de proceder.
Por isso, continua São Paulo: “Com efeito, por um homem veio a morte e é também por um homem que vem a ressurreição dos mortos. Como em Adão todos morrem, assim também em Cristo todos reviverão” (I Cor 15, 21-22). Ao traçar um paralelo entre Cristo e Adão, o Apóstolo mostra que não conheceríamos a morte se não fosse o pecado do primeiro homem, sendo necessário que outro homem triunfasse sobre ele. Nossas almas já foram purificadas da mancha original pelo Batismo, mas falta-nos ainda vencer a morte com os nossos corpos ressurrectos. “Porém, cada qual segundo uma ordem determinada: em primeiro lugar, Cristo, como primícias; depois os que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda” (I Cor 15, 23). Entre os que são d’Ele destaca-Se Nossa Senhora, a mais excelsa criatura humana, que adquire corpo glorioso e ocupa no Céu um lugar especial por ser a Mãe de Deus.
Embora a Igreja não tenha definido se Maria morreu ou não, é dogma de Fé que Ela transpôs os umbrais da eternidade em corpo e alma, realizando o plano de Deus. Sua Assunção oferece-nos um penhor de esperança, que em certo sentido pode ser considerado maior que o da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Esta ousada afirmação prende-se a que Ela, enquanto pura criatura, é a Filha primogênita da Igreja, o membro de máxima elevação do Corpo Místico de Cristo, e Se encontra, portanto, mais próxima de nossa contingência humana que seu Divino Filho, que é Homem mas também é Deus.
A exemplo de Maria
Na passagem de Maria Santíssima deste mundo para a eternidade vislumbramos desde já o que nos acontecerá no Juízo Final, caso venhamos a morrer em estado de graça. Todos nós — esta é uma profecia que qualquer um pode fazer, sem risco de incorrer em erro — partiremos desta vida. E quanto tempo mediará entre a morte e a ressurreição? Não importa, pois para Deus nada é impossível. Nossa alma foi por Ele criada a partir do nada e o corpo, embora tenha origem humana nos pais, foi constituído por Ele. Adão, o mais belo ser de toda a obra da criação, foi modelado como um boneco de barro por um artista chamado Deus, e também o barro foi criado sem qualquer matéria preexistente, como o resto do universo. Isto nos mostra que Deus, sendo onipotente, pode criar e recriar todos os seres. Assim como nos formou individualmente e infunde a alma em cada criança recém-concebida, pode mandar que os restos mortais de homens falecidos — alguns há milhares de anos, como nossos pais Adão e Eva — sejam reunidos e seus corpos reconstituídos em estado glorioso. Em última análise, a ressurreição certifica a onipotência divina. Pela simples lembrança de que morreremos, seremos sepultados e esperaremos até sermos recompostos de forma gloriosa, a ponto de adquirirmos um corpo espiritualizado, já antegozamos esse momento de extraordinária beleza em que triunfaremos, como Nossa Senhora no dia da Assunção.
Maria não podia conter mais graça
É edificante considerar que, independentemente de Maria Santíssima ter morrido ou não, pelo fato de ser imaculada nunca sofreu Ela nenhuma enfermidade, não envelheceu ou padeceu a menor mazela decorrente do pecado, e seu corpo não esteve sujeito à decomposição, sendo esta uma das razões de sua Assunção ao Céu. Levantemos, porém, algumas hipóteses a respeito de outros motivos que terão levado Nossa Senhora a passar desta vida para a eternidade com seu corpo glorioso.
Ensina a doutrina católica ser a caridade uma virtude que se radica na vontade.7 Quando é muito forte, o amor impele quem ama a unir-se a quem é amado. Todo cristão, no dia do Juízo, deve apresentar seu progresso na caridade, por ser ela imprescindível para entrar no Céu. Ora, houve alguém que partiu desta vida não com amor, mas por amor: Nossa Senhora. Afirma Santo Alberto Magno que “mais obrigação tem de amar aquele a quem se dá mais. A Beatíssima Virgem foi dado mais que a todas as criaturas; logo, estava obrigada a amar mais do que qualquer outra”.8 E assim o fez, conclui o santo doutor. N’Ela, a caridade intensificou-se de tal maneira que o corpo não mais podia sustentar a alma, e o desejo de contemplar a Deus face a face para unir-Se a Ele fez com que a alma de Maria Santíssima, ao subir, levasse também o corpo. A par disso, é certo que n’Ela a graça, embora plena desde sua concepção, aumentou incessantemente ao longo da vida a ponto de mais não comportar quando ocorreu a Assunção. Eis a maravilha de uma criatura humana que, de plenitude em plenitude, de perfeição em perfeição, havia chegado ao extremo limite de todas as medidas, até quase não existir diferença entre a sua compreensão do universo e a própria visão de Deus. O que Lhe faltava? Apenas a Assunção. Sua alma atingiu tal sublimidade, alcandoramento e esplendor, que o véu de separação entre a natureza humana e a visão beatífica tornou-se tênue, se desfez, e — sem necessidade de passar por qualquer julgamento — Ela viu a Deus. Em consequência, seu corpo tornou-se glorioso e Ela elevou-Se ao Céu.
Subindo ao Céu por força da graça
Em função disso é indispensável corrigir certa visualização oferecida por algumas obras de arte, até piedosas, em que Maria aparece en volta numa nuvem, elevada ao Céu por uns anjinhos, representados na maioria das vezes como se fizessem esforço para conduzi-La.
Na verdade, por ter a alma na visão beatifica, seu corpo glorificado já gozava da agilidade, uma das qualidades deste estado. Ela deslocava-Se com extraordinária facilidade, com a rapidez do pensamento podendo subir ao Céu por Si mesma, Os Anjos A teriam acompanhado? Sim, mas por veneração, sem precisar transportá-La, uma vez que Ela possuía mais glória que todos eles juntos.
Em que consiste, então, a diferença entre a Assunção de Maria e a Ascensão do Senhor? Ele subiu aos Céus tanto por seu poder divino — pois é o próprio Deus — quanto pela virtude de sua Alma glorificada, que movia seu Corpo.9 E a Assunção de sua Mãe Virginal teve como causa apenas a glória de seu corpo, submisso à sua alma bem-aventurada.
A humanidade divinizada entra na glória

Outra razão da conveniência deste magnífico acontecimento é a restituição prestada a Deus por todos os benefícios concedidos ao gênero humano. Uma vez que a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade desceu dos Céus, para Se encarnar, trazendo ao mundo a divindade humanizada, seria justo que uma pessoa humana fizesse um oferecimento harmonicamente contrário e levasse para o Céu o melhor da santidade, o que de mais belo, excelente e extraordinário pudesse existir na Terra: a humanidade divinizada. Tal missão foi reservada a Maria. Por outro lado, Ela foi o sacrário do Filho de Deus durante os nove meses nos quais gerou a humanidade santíssima de Cristo. Era compreensível que havendo-O recebido como tabernáculo na Terra, também Ele A recebesse em seu Santuário Celeste.
Continua no próximo post.

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